Módulo 1A vigilância em saúde e as vigilâncias do campo da saúde

Introdução

Neste módulo vamos delinear a construção do conceito atual de vigilância em saúde no Brasil, ao mesmo tempo em que apresentamos sucintamente as transformações dos serviços federais de vigilância sanitária e de vigilância epidemiológica e controle de doenças.

Vamos também analisar as definições de vigilância epidemiológica, vigilância sanitária, vigilância ambiental e vigilância em saúde do trabalhador; descrever os principais elementos dos referenciais teóricos das vigilâncias em saúde, seus marcos históricos e de seus processos de trabalho.

Este módulo está organizado em três temas:

  • Tema 1.1. A vigilância em saúde no Brasil: os dois sistemas nacionais
  • Tema 1.2. As definições e os conceitos estruturantes
  • Tema 1.3. Os processos de trabalho das vigilâncias em saúde

Para continuar seus estudos, siga para o Tema 1.1. A vigilância em saúde no Brasil: os dois sistemas nacionais.

Tema 1.1A vigilância em saúde no Brasil: os dois sistemas nacionais

Para refletir

Antes de iniciarmos o estudo deste tema, pense no seguinte:

O que você entende por vigilância em saúde?

O que você entende por vigilância epidemiológica, vigilância sanitária, vigilância ambiental e vigilância em saúde do trabalhador?

Qual a importância dessas vigilâncias para a área da saúde?

O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.

Foto:Jan Ribeiro/Pref.Olinda. Flickr.

Enfatizaremos a vigilância em saúde, sua definição nacional e internacional, destacando-se a sua organização em dois sistemas, no Brasil: um, destinado ao controle e prevenção de doenças (Sistema Nacional de Vigilância em Saúde); outro, à segurança sanitária ou ao “controle sanitário de bens e serviços” (Sistema Nacional de Vigilância Sanitária).

Na atualidade, no Brasil, as vigilâncias – sanitária, epidemiológica, ambiental, e em saúde do trabalhador – constituem práticas sanitárias que, em seu conjunto, visam promover, prevenir e proteger a saúde da população (DE SETA; OLIVEIRA; PEPE, 2017).

a) Três elementos de uma controvérsia no Brasil

Primeiro elemento: nas origens, vigilância sanitária

O que se denominou por vigilância sanitária, no Brasil do século XIX, reunia elementos do que veio a se confirmar no último quartel do século XX como vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, e correspondia à Saúde Pública da época.

DE SETA, M. H.; OLIVEIRA, C. V. S.; PEPE, V. L. E. Proteção à saúde no Brasil: o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 10, p. 3225-3234, out. 2017. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232017021003225&lng=pt&
nrm=iso. Acesso em: 07 jan. 2020.
Leitura complementar

Para saber mais sobre a vigilância sanitária brasileira do século XIX até à constituição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ver Mostra Cultural Vigilância Sanitária e Cidadania.

Segundo elemento: uma confusão que não é apenas semântica

Há uma polêmica sobre o significado de “vigilância da/na/em saúde”, que se evidencia na leitura de vários autores.

Nesse sentido, Albuquerque, Carvalho e Lima (2002) afirmam que os termos “vigilância à saúde”, “vigilância em saúde” e “vigilância da saúde” vêm sendo amplamente citados na literatura, no país, sem que haja uma definição “instituída” dos seus objetos ou uma conceituação que seja remetida à prática.

Concordantes, Teixeira e Pinto (1993, p. 6) já chamavam a atenção de que o termo “vigilância à saúde” representa um “imenso guarda-chuva” que busca articular “práticas dispersas e heterogêneas em saúde coletiva”, desde as assistenciais até as dirigidas para a prevenção.

Com a ampliação da vigilância epidemiológica, abarcando, além das doenças transmissíveis, as não transmissíveis e os fatores de risco, o termo “vigilância em saúde” ou “vigilância em saúde pública” tem enfatizado o trabalho com os sistemas de informação.

Mas, para Mendes (1993), a vigilância à saúde não se resume em ação de produção de informação; é principalmente intervenção sobre os fatores que determinam e condicionam problemas de enfrentamento contínuo, que incorpora, também, ações de caráter individual.

Entretanto, Silva Júnior (2004, p. 80), uma opinião abalizada, afirmou que: “pelas definições integrantes dos dispositivos legais, e pela sua prática efetivamente exercida no sistema de saúde, não considero possível situar a vigilância sanitária como integrante das ações de vigilância em saúde pública”.

ALBUQUERQUE, M. I. N. de; CARVALHO, E. M. F. de; LIMA, L. P. Vigilância epidemiológica: conceitos e institucionalização. Revista Brasileira de Saúde Materno-Infantil, Recife, v. 2, n. 1, p. 7-14, jan./abr. 2002.
TEIXEIRA, C. F.; PINTO, L. L. A formação de pessoal em vigilância à saúde. Informe Epidemiológico do SUS, Brasília, v. 6, p. 5-21, 1993.
MENDES, E.V. A construção social da vigilância à saúde no distrito sanitário. In: MENDES, E. V. (Org.). A vigilância à saúde no distrito sanitário. Brasília: Opas, 1993. p. 7-19 (Série Desenvolvimento de serviços de saúde, 10).
SILVA JÚNIOR, J. B. da. Epidemiologia em serviço: uma avaliação de desempenho do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde. 2004. 318 p. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) – Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2004.
Foto: Secretaria de Saúde de Olinda. Flickr.

Tendo como eixo a construção de sistemas municipais de saúde e a reformulação do modelo assistencial, Teixeira (1998) sistematizou três vertentes do que chamam de “vigilância em saúde”. Clique nas vertentes abaixo para saber mais:

TEIXEIRA, C. F. SUS, modelos assistenciais e vigilância da saúde. IESUS, v. 2, n. 2, abr./jun., 1998.
“Vigilância em saúde” equivale a “análise de situações de saúde”

A ampliação do escopo de atuação da vigilância epidemiológica tradicional (focada nas doenças transmissíveis) contribui para um planejamento em saúde mais abrangente. Essa ampliação deve incluir aspectos relativos à organização e à produção dos serviços de saúde, investigação das doenças e agravos (violência, acidentes, mortalidade infantil e materna etc.), a geração de bases de dados padronizadas, a partir dos sistemas de informação nacionais, e análise das mesmas com o objetivo de produzir informações confiáveis e oportunas que subsidiem o planejamento das ações em saúde.

Vigilância em saúde como proposta de integração institucional entre as vigilâncias epidemiológica e sanitária

Concretizou-se mediante reformas administrativas, com a criação de departamentos de vigilância da saúde ou órgãos similares, inicialmente nas secretarias estaduais de saúde, na primeira metade da década de 1990.

Vigilância em saúde como uma proposta de redefinição das práticas sanitárias

Caracteriza a vigilância em saúde como a possibilidade de organizar processos de trabalho em saúde num território delimitado, para enfrentar problemas através de operações montadas em diferentes períodos do processo saúde-doença.

Assim, possui como características básicas:

  • a intervenção sobre problemas de saúde;
  • a ênfase em problemas que requeiram atenção e acompanhamento contínuos;
  • a articulação entre ações de cunho promocionais e preventivas;
  • a atuação intersetorial e sobre o território;
  • a intervenção sob a forma de operações.

Essa vertente aponta para a necessidade de mudança do processo de trabalho e de incorporação de outros sujeitos, gerentes de serviços, técnicos e representantes de grupos organizados da população.

A existência dessas três diferentes vertentes, como resultado de diversas formulações e de experiências práticas também diversas, faz com que, ao se falar em “vigilância da saúde”, seja necessário perguntar:

Mas, de que vertente da vigilância da/na/em saúde estamos falando?

No senso comum, o termo “vigilância da saúde” é algumas vezes substituído mecanicamente por “vigilância em saúde”, como se fossem sinônimos. Mesmo com essa relativa confusão, é importante realçar que, nesse sentido corrente, os dois termos carregam uma conotação positiva de ação mais articulada das vigilâncias.

Para refletir

Você considera que mudanças no nome do serviço ou no organograma podem resultar em renovação de práticas e tornar as ações menos fragmentadas? Por quê?

O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.

Foto: Ádria de Souza/Pref.Olinda. Flickr.

Terceiro elemento: estruturação, em separado, das vigilâncias

As vigilâncias se estruturam separadamente em diversos países:

  • Nos Estados Unidos da América, as vigilâncias se estruturam nacionalmente, por meio de dois órgãos federais: o Centro de Controle de Doenças – CDC e a Agência de Controle de Drogas e Alimentos – FDA, responsáveis pelo controle sanitário de alimentos e de medicamentos. Apesar de ser esse país uma federação, não há repartição de competências entre os dois entes federados na área das vigilâncias.
  • Na França, em 1998, criou-se um instituto nacional voltado para as questões de vigilância em saúde pública (Institut de Veille Sanitaire/InVS), e agências para o fortalecimento da segurança sanitária de alimentos, medicamentos e produtos de saúde.

b) Vigilância em saúde no Brasil: uma construção ancorada em vigilância epidemiológica e controle de doenças

Eliseu Waldman afirma que, internacionalmente, a vigilância de doenças recebeu o qualificativo “epidemiológica” em 1964/66; e que a vigilância epidemiológica passou a ser denominada como “vigilância em saúde pública”, em 1989. Essa mudança de denominação não teria trazido grandes modificações conceituais ou operacionais, pois o foco da vigilância epidemiológica ampliara-se para além das doenças transmissíveis em anos anteriores (WALDMAN, 1998).

Nessa progressiva ampliação, a vigilância epidemiológica abarcou além das doenças transmissíveis, as não transmissíveis e os fatores de risco, inclusive os relacionados ao ambiente. Ao mesmo tempo, os termos “vigilância em saúde” e “vigilância em saúde pública” enfatizam o trabalho com informação para ação.

No Brasil, o desenvolvimento da vigilância epidemiológica foi acompanhado da criação dos sistemas de informações em saúde, de alimentação descentralizada e coordenação centralizada no Ministério da Saúde. Dentre esses, o Sistema de Informações sobre Mortalidade (Sim), implantado em 1975, o Sistema Nacional sobre Nascidos Vivos (Sinasc), implantado em 1989 (JORGE; LAURENTI; GOTLIEB, 2007) e o Sistema de Informações sobre Agravos de Notificação (Sinan), desenvolvidos no Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi) a partir dos anos 1990, que veio substituir o antigo Sistema de Notificação Compulsória de Doenças.

JORGE, Maria Helena Prado de Mello; LAURENTI, Ruy; GOTLIEB, Sabina Léa Davidson. Análise da qualidade das estatísticas vitais brasileiras: a experiência de implantação do SIM e do Sinasc. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 12, n. 3, p. 643-654, June 2007. Disponível em: from http://www.scielo.br. Acesso em 8 out. 2019.

No final dos anos 1990, consolidaram-se as propostas de “vigilância ambiental em saúde pública” (THACKER et al., 1996) e de “vigilância em saúde pública” (LEVY, 1996) nos países industrializados.

THACKER, S. B. et al. Surveillance in environmental public health: issues, systems, and sources. American Journal of Public Health, v. 86, n. 5, p. 633-638, 1996.
LEVY, B. S. Toward a holistic approach to public health surveillance. American Journal of Public Health, v. 86, n. 5, p. 624- 625, May 1996.

No Brasil, as mudanças de denominação da vigilância epidemiológica para vigilância em saúde podem ser referidas às transformações do serviço federal de epidemiologia e às versões dos Regulamentos Sanitários Internacionais (RSI), que serão abordadas sucintamente, ainda neste módulo.

O Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi), criado em 1990 como um departamento da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), objetivava orientar e articular as ações realizadas pelo Ministério da Saúde e pelas secretarias estaduais no que tange à vigilância e controle de doenças.

Desde seu início, além da coordenação nacional do sistema de vigilância epidemiológica, o Cenepi incorporou alguns programas de controle de doenças (SILVA JÚNIOR, 2004) e, a partir de 2000, ainda integrando a estrutura da Funasa, passou a ser também responsável pelo Sistema de Vigilância em Saúde Ambiental.

SILVA JÚNIOR, J. B. da. Epidemiologia em serviço: uma avaliação de desempenho do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde. 2004. 318 p. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) – Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2004.

No início dos anos 2000 houve uma tentativa de autonomização do Cenepi com o envio de projeto que previa a instituição dos Sistemas Nacionais de Epidemiologia, de Saúde Ambiental e de Saúde Indígena, e a criação de uma Agência Federal de Prevenção e Controle de Doenças – Apec (DE SETA, 2007).

DE SETA, M. H. A construção do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária: uma análise das relações intergovernamentais na perspectiva do Federalismo. 2007. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) - IMS/UERJ, Rio de Janeiro, 2007.

Esse projeto foi rejeitado em 2002 e, em 2003, o Cenepi foi extinto, dando lugar à Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde. Com essa secretaria, disseminou-se uma concepção de vigilância em saúde pública em consonância com o que se chamou de “modelo CDC”, durante a gestão de Jarbas Barbosa no Cenepi (1997-2003) e na Secretaria de Vigilância em Saúde/MS (2003-2006).

Na gestão de Gerson Penna na secretaria (2007-2011), no bojo das mudanças da política de saúde da época, ocorreram mudanças no modelo mediante a Portaria n. 3.252, de 22 de dezembro de 2009, revogada pela Portaria n. 1.378, que será abordada ainda neste módulo: “Uma portaria ministerial reúne práticas distintas”.

A atual estrutura da Secretaria de Vigilância em Saúde/MS (BRASIL, 2019), compreende cinco departamentos:

  • Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis (DEIDT);
  • Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças não Transmissíveis (DASNT);
  • Departamento de Articulação Estratégica de Vigilância em Saúde (DAEVS);
  • Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI); e
  • Departamento de Saúde Ambiental, do Trabalhador e Vigilância das Emergências em Saúde Pública (DSASTE).

c) Vigilância sanitária no Brasil: uma construção ancorada no controle sanitário de viajantes, bens e serviços de interesse da saúde

BRASIL. Decreto n. 9.795, de 17 de maio de 2019. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Saúde, remaneja cargos em comissão e funções de confiança, transforma funções de confiança e substitui cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - 1DAS por Funções Comissionadas do Poder Executivo - FCPE. Diário Oficial da União: edição 95, seção 1, Brasília, DF, p. 2, maio, 2019.

No escopo de atuação da vigilância sanitária, por ocasião de sua estruturação no Brasil, estavam incluídas: inspeção dos portos, fiscalização e regulamentação do comércio de alimentos e bebidas e controle de práticas sanitárias e do exercício profissional da época. Essas atividades eram executadas por diferentes setores da administração sanitária federal.

Em 1973, foi sancionada a Lei n. 5.991 para disciplinar o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos e insumos farmacêuticos. Em 1976, instalou-se uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) após aflorarem denúncias contra a indústria de medicamentos. Emitiu-se a Lei n. 6.360 (BRASIL, 1976a) e foi criada a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária no Ministério da Saúde (BRASIL, 1976b), em dezembro do mesmo ano.

BRASIL. Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispõe sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as Drogas, os Insumos Farmacêuticos e Correlatos, Cosméticos, Saneantes e Outros Produtos, e dá outras Providências. Diário Oficial da União: seção1, p. 12647, 24 de setembro, 1976a.
BRASIL. Decreto n. 79.056, de 30 de dezembro de 1976. Dispõe sobre a organização do Ministério da Saúde e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, p. 17163, dezembro, 1976b.

No ano seguinte a Lei n. 6.437, de 20 de agosto de 1977, definiu as infrações sanitárias e as respectivas sanções, substituindo o Decreto-Lei anterior que disciplinava a atuação da vigilância sanitária desde 1969.

O exercício profissional gradativamente deixou de ser atribuição da vigilância sanitária, passando a ser de responsabilidade dos conselhos profissionais. Todavia, o exercício de profissões ou ocupações de saúde sem que haja a necessária habilitação legal representa infração sanitária e o estabelecimento que abrigar essa prática irregular é passível de interdição e multa pela vigilância sanitária:

"À Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS) compete promover ou elaborar, controlar a aplicação e fiscalizar o cumprimento de normas e padrões de interesse sanitário relativos a portos, aeroportos, fronteiras, produtos médico-farmacêuticos, bebidas, alimentos e outros produtos ou bens, respeitadas as legislações pertinentes, bem como efetuar o controle sanitário das condições do exercício profissional relacionado com a saúde. " (BRASIL, Art. 13 do Decreto n. 79.056, de 30 de dezembro de 1976b).
BRASIL. Decreto n. 79.056, de 30 de dezembro de 1976. Dispõe sobre a organização do Ministério da Saúde e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, p. 17163, dezembro, 1976b.

A Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária, posteriormente chamada de Secretaria de Vigilância Sanitária, deu lugar à criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), novamente em meio a escândalos de mau funcionamento dos serviços de saúde e de falsificação e fraude em medicamentos.

A Anvisa é uma autarquia especial, caracterizada pela independência administrativa, estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira. Seus dirigentes gozam de mandato e estabilidade no cargo após serem sabatinados no Senado Federal.

A lei que criou a Anvisa e definiu suas competências e finalidade institucional instituiu também o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (Lei n. 9.782, de 26 de janeiro de 1999), que ela coordena:

"A Agência terá por finalidade institucional promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras. " (BRASIL, Art. 6º. da Lei n. 9.782, de 26 de janeiro de 1999).
BRASIL. Lei n. 9.782, de 26 de janeiro de 1999. Define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, p.1, 27 de janeiro de 1999.

A criação da Anvisa como agência reguladora mudou a face da vigilância sanitária e representou o reconhecimento do Estado brasileiro da natureza especial dessa atividade do campo da saúde:

"A vigilância sanitária é uma prática de saúde coletiva, típica de Estado, que deve intervir sobre os riscos à saúde da população, sejam eles decorrentes do meio ambiente ou do processo de produção, comercialização e consumo de bens, bem como da prestação de serviços de interesse sanitário. Ela integra o SUS por determinação constitucional [...] " (DE SETA et al., 2010, p. 120).

Uma das formas de intervenção da vigilância sanitária se dá mediante a elaboração de normas sanitárias.

DE SETA, M. H. et al. A coordenação federativa na construção do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e no Estado do Rio de Janeiro. In: UGÁ, M. A. D. et al. (orgs.). A gestão do SUS no âmbito estadual: o caso do Rio de Janeiro [online]. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2010, pp. 119-146.
Leitura complementar

Para acessar as normas emitidas pela Anvisa, visite as bibliotecas temáticas de normas organizadas nos seguintes temas:

Também é interessante conhecer os temas transversais.

Foto: Ádria de Souza/Pref.Olinda. Flickr.

d) Uma portaria ministerial reúne práticas distintas

Em 22 de dezembro de 2009, o Ministério da Saúde publicou a Portaria n. 3.252, que incluiu a vigilância sanitária no escopo da vigilância em saúde, com seu sistema nacional próprio. A Portaria n. 3.252 aprovava as diretrizes para execução das ações de vigilância em saúde e definia os seus componentes:

  • Vigilância epidemiológica
  • Promoção da saúde
  • Vigilância da situação de saúde
  • Vigilância em saúde ambiental
  • Vigilância em saúde do trabalhador
  • Vigilância sanitária

A Portaria n. 3.252 recebeu críticas de inúmeras ordens e de diversos segmentos, fundamentadas ou não. Dentre elas, a inclusão da promoção da saúde entre os componentes da vigilância em saúde, com o risco de ela ficar restrita à concepção de “estilos de vida”. Ela foi revogada por meio da Portaria n. 1.378, de 09 de julho de 2013, que manteve a vigilância em saúde organizada em dois sistemas nacionais.

A Portaria n. 1.378 redefiniu a vigilância em saúde, tal como descrito abaixo, e estabeleceu responsabilidades e diretrizes para execução e financiamento das ações de vigilância em saúde pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, relativos ao Sistema Nacional de Vigilância em Saúde e ao Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

A Portaria n. 1.378 teve sua revogação total, mas seu conteúdo foi encampado nas Portarias de Consolidação (PRC) de n. 04 – que trata dos sistemas e subsistemas do SUS –, e na de n. 06 – que trata do financiamento e dos repasses federais para ações e serviços de saúde do SUS.

Quão distintas e relevantes são as práticas reunidas na vigilância em saúde, é o que veremos a seguir.

"A Vigilância em Saúde constitui um processo contínuo e sistemático de coleta, consolidação, análise e disseminação de dados sobre eventos relacionados à saúde, visando o planejamento e a implementação de medidas de saúde pública para a proteção da saúde da população, a prevenção e controle de riscos, agravos e doenças, bem como para a promoção da saúde. " (BRASIL, 2013).
BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria n. 1.378, de 9 de julho de 2013.

Com isso, finalizamos o Tema 1.1. Agora, você pode avançar para o Tema 1.2. As definições e os conceitos estruturantes.

Tema 1.2As definições e os conceitos estruturantes

Em toda esta unidade de aprendizagem, e mais ainda aqui neste tema, o uso do termo vigilâncias do campo da saúde ou vigilâncias em saúde respalda-se no reconhecimento de que todas as vigilâncias não se valem de um único método, e sim que elas se valem de métodos e de aportes de diversas disciplinas científicas. E também que, usando conceitos comuns, fazem deles um uso diferenciado.

Reconhecer as especificidades das vigilâncias é construir pontes para que efetivamente elas possam colaborar entre si e com o campo da assistência à saúde, para a melhoria da qualidade de vida da população.

O campo das vigilâncias em saúde, no Brasil, não se construiu de forma linear. Seu desenvolvimento foi desigual no tempo e, em cada contexto histórico, em relação a cada um dos seus principais componentes, as vigilâncias sanitária, epidemiológica, ambiental e em saúde do trabalhador.

Do ponto de vista da legislação constitucional, as bases para a construção do campo das vigilâncias encontram-se no Art. 200 da Constituição Federal de 1988, e na Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990.

Dos oito incisos desse artigo, apenas o III e o V não se encontram compreendidos integralmente nas vigilâncias em saúde.
Atividade de autoavaliação

Vamos realizar, agora, uma atividade de análise.

Após a leitura do Art. 200, você deve ter percebido que, no texto constitucional, há uma gradação entre ações a serem diretamente executadas e outras para as quais o SUS deve participar e/ou colaborar.

Como você explica essa gradação?

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.

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Essa gradação que se percebe no texto constitucional significa o reconhecimento de responsabilidade direta e de corresponsabilidade pelo setor saúde por atribuições que, na estrutura do Estado brasileiro, se encontram sob a responsabilidade de outros órgãos governamentais.

Isso contribuiu, em parte, para o desenvolvimento desigual do campo, mas houve também um desenvolvimento conceitual e histórico desigual entre os componentes das vigilâncias em saúde.

Como exemplo, o tema ambiente, que entra na agenda política e científica global na década de 1990, tendo como marcos a Conferência Rio 92 e a Agenda 21.

Conforme vimos, no tema 1.1, no plano internacional, no final dos anos 1990, nos países industrializados, formulam-se as propostas de “vigilância ambiental em saúde pública” (THACKER et al., 1996) e de “vigilância em saúde pública” (LEVY, 1996).

Essas propostas:

THACKER, S. B. et al. Surveillance in environmental public health: issues, systems, and sources. American Journal of Public Health, v. 86, n. 5, p. 633-638, 1996.
LEVY, B. S. Toward a holistic approach to public health surveillance. American Journal of Public Health, v. 86, n. 5, p. 624- 625, May 1996.
"[...] continham pelo menos três elementos que deveriam estar integrados:
(1) a vigilância de efeitos sobre a saúde, como agravos e doenças, tarefa tradicionalmente realizada pela vigilância epidemiológica;
(2) a vigilância de perigos, como agentes químicos, físicos e biológicos que possam ocasionar doenças e agravos, tarefa tradicionalmente realizada pela vigilância sanitária;
(3) a vigilância de exposições, através do monitoramento da exposição de indivíduos ou grupos populacionais a um agente ambiental ou seus efeitos clinicamente ainda não aparentes (subclínicos ou pré-clínicos), desafio para a estruturação da vigilância ambiental" (FREITAS; FREITAS, 2005).
FREITAS, M. B., FREITAS, C. M. A vigilância da qualidade da água para consumo humano: desafios e perspectivas para o Sistema Único de Saúde. Ciênc. saúde coletiva [on-line]. 2005, vol.10, n. 4, pp. 993-1004.
Foto: Eduardo de Oliveira (Radis/Ensp). Flickr.

Sob a influência dessas propostas, e com financiamento do Banco Mundial, no Brasil, no final dos anos 1990, através do projeto de Estruturação do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde (Vigisus), inicia-se a institucionalização do tema ambiente no setor saúde.

Também vimos que, no Ministério da Saúde, mais precisamente na Funasa, criou-se a Vigilância Ambiental em Saúde. Acrescentamos agora que também se propôs a estruturação de um sistema nacional de vigilância ambiental em saúde (Sinvas). Em maio de 2000, por meio do Decreto n. 3.450, estabeleceu-se, no Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi), a gestão do então chamado Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica e Ambiental em Saúde. A partir de 2005, o Sinvas foi redefinido e passa a ter a sigla Sinvsa (Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental). O modelo de vigilância ambiental se estendeu do âmbito federal para algumas secretarias estaduais de saúde (FREITAS; FREITAS, 2005).

O Decreto n. 3.450, de 09 de maio de 2000 (revogado), definia a estrutura da Funasa.
Caderno de Estudo

Os tópicos deste tema que estão exclusivamente no Caderno de Estudo são:

  1. As definições de vigilância sanitária, vigilância epidemiológica, vigilância ambiental e vigilância em saúde do trabalhador
  2. Os conceitos, suas origens e seus usos pelas vigilâncias

Agora, inicie o estudo no Caderno de Estudo. Lá você encontrará orientações para voltar a navegar neste ambiente.

Atividade de autoavaliação

Depois de ter lido o conteúdo do Tema 1.2, no Caderno de Estudo, responda à questão abaixo:

Você vê aspectos comuns nas definições das vigilâncias? Cite pelo menos três deles.

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Atividade de autoavaliação

Assista ao vídeo Enquanto o gato dorme... e descreva, pelo menos, três situações relacionadas ao que foi discutido sobre risco até o momento, e como cada personagem percebe e reage ao risco.

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Para refletir

Tendo em vista o conceito de risco, dê ao menos dois exemplos de eventos que possam ter consequências negativas à saúde, identificando os respectivos fatores de risco em cada um dos componentes das vigilâncias em saúde.

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Atividade de autoavaliação

Pesquise na internet as notícias e os documentos sobre o Caso Celobar® e, depois, responda:

  • Pesquise na internet as notícias e os documentos sobre o Caso Celobar® e, depois, responda:
  • Como foi realizada a identificação do risco?
  • Como foi avaliado o risco?
  • Qual a sua avaliação sobre a comunicação do risco?

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Com isso, finalizamos o Tema 1.2. Agora, você pode avançar para o Tema 1.3. Os processos de trabalho das vigilâncias em saúde.

Tema 1.3Os processos de trabalho das vigilâncias em saúde

Para refletir

Agora, que já se incluíram as vigilâncias em saúde no campo da promoção da saúde, e que foram abordados seus principais conceitos, pode-se perguntar:

Como atuam os componentes das vigilâncias em saúde?

Ou, dito de outra maneira:

Qual o seu processo de trabalho?

O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.

Não se pretende, aqui, fazer uma análise exaustiva do processo de trabalho em cada uma das vigilâncias, mas apenas apontar o que há de comum e específico nelas, do ponto de vista da gestão do sistema local de saúde.

Ressalte-se que o processo de trabalho em saúde tem sido bastante estudado no que concerne à assistência, mas, no componente das vigilâncias em saúde, ele não está plenamente analisado na literatura.

Primeiro, há que se falar sobre o que é um processo de trabalho.

Qualquer processo de trabalho pode ser definido como um conjunto de ações sequenciadas que envolve atividades da força de trabalho e a utilização dos meios de trabalho, visando o alcance de objetivos e metas.

Este tema foi elaborado tendo como base a referência:
ESCOLA POLITÉCNICA DE SAÚDE JOAQUIM VENÂNCIO. O processo de trabalho da vigilância em saúde. Carmem Fontes Teixeira, Lorene Louise Pinto, Ana Luiza Vilasbôas. Rio de Janeiro: Fiocruz/EPSJV/PROFORMAR, 2004. 60p: II. Série Material Didático do Programa de Formação de Agentes Locais de Vigilância em Saúde, 5.

Os elementos componentes do processo de trabalho são:

  • A atividade adequada a um fim, isto é, o próprio trabalho.
  • A matéria a que se aplica o trabalho, o objeto de trabalho.
  • Os meios de trabalho, o instrumental de trabalho.

As atividades e as finalidades do processo de trabalho

Qualquer processo de trabalho, inclusive o processo de trabalho da saúde, deve ter uma finalidade.

A finalidade “mais ampla” do processo de trabalho nas vigilâncias já foi vista anteriormente: promover e proteger a saúde, atuando sobre determinantes e riscos à saúde.

Entretanto, ao se pensar no Sistema Único de Saúde, em todas as esferas de gestão (municípios, estados e União), e as diferentes formas de organização social das ações de saúde que buscam responder às necessidades e conhecer os problemas de saúde de cada local, é possível citar algumas finalidades específicas.

No âmbito local, o que há de comum entre as vigilâncias em saúde é a finalidade específica de reconhecer os problemas de saúde locais e atender às necessidades de saúde em seu território, sejam elas “sentidas” ou não pela comunidade, e identificadas ou não pelos profissionais de saúde.

Muito se tem falado sobre o conceito de “território”, mas que território é esse?

Aqui, é preciso ressaltar que não se trata apenas de uma divisão no sentido físico, nem se limita igualmente às fronteiras nacionais ou aos limites (divisas) estaduais ou municipais.

Embora qualquer território tenha seus objetos fixos (casas, centro de saúde, escolas etc.), existem sempre os fluxos (de pessoas, de informações, de produtos, de dinheiro e também de doenças etc.) que, muitas vezes, ultrapassam a divisão territorial administrativa (país, estado, município, região administrativa, setor censitário).

Além disso, os territórios são sempre dinâmicos: neles se estabelecem relações entre as pessoas no cotidiano de suas vidas; são espaços de poder (administrativo, político, cultural etc.) e, na sua dinamicidade, mudam com maior ou menor rapidez.

Lembre-se:

"[...] O território é sempre um campo de atuação, de expressão do poder público, privado, governamental ou não governamental e, sobretudo, populacional. Cada território tem uma determinada área, uma população e uma instância de poder [...] " (BARCELLOS; ROJAS, 2004).
BARCELLOS, C.; ROJAS, L. O. Lugares, territórios, população. In: BARCELLOS, C.; ROJAS, L. O. O território e a vigilância em saúde. Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, 2004.

Esse entendimento é de suma importância para as vigilâncias em saúde. Senão, vejamos.

Um município que trabalhe para conter a ocorrência de dengue pode ter sua população afetada se o município vizinho não fizer o mesmo: o Aedes aegypti não respeita a divisa municipal.
Da mesma forma, Rio de Janeiro e São Paulo são estados que concentram o maior parque produtivo de produtos farmacêuticos, e os medicamentos ali produzidos são transportados e consumidos em todo o país e, algumas vezes, mesmo no exterior.
No que se refere ao meio ambiente, basta recordar o desastre ambiental do Rio Pomba, quando o vazamento de produto químico, em 2003, da fábrica de papel Cataguases, em Minas Gerais, contaminou os Rios Muriaé e Paraíba do Sul, atingindo a população ribeirinha de municípios do Rio de Janeiro, e provocando desabastecimento.

Tendo o conceito de “território” em mente, pode-se entender que a resposta às necessidades de saúde e a identificação dos problemas de saúde são igualmente finalidades das esferas de governo no âmbito da saúde, para que possam organizar suas ações.

E pode-se pensar que esse território vai sendo socialmente construído de forma cada vez mais complexa, de acordo com a esfera de governo que deve “atuar”.

Quanto ao conceito de território, há uma especificidade da vigilância sanitária, que é a única das vigilâncias que detém, constitucionalmente, o poder de polícia no âmbito da saúde.

O Brasil é uma federação. O poder de polícia administrativa sanitária tem que obedecer à estrutura da federação. Para exercer o poder de polícia da vigilância sanitária, que a habilita a regulamentar, fiscalizar, investigar denúncias e aplicar penalidades, a autoridade sanitária precisa ser federal, estadual ou municipal.

A instância regional para o uso do poder de polícia da vigilância sanitária é a esfera estadual visto que a regionalização na saúde pode ultrapassar as divisas estaduais e municipais. Assim, a regionalização da vigilância sanitária, diferentemente das demais vigilâncias, precisa ser diferenciada.
Atividade de autoavaliação

Vamos fazer uma atividade de avaliação prática.

Imagine os fluxos, os riscos e os interesses envolvidos quando da solicitação de um registro de medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Suponha que esse medicamento não esteja registrado nos Estados Unidos e que represente uma recente inovação. E que ele vá ser produzido inclusive para ser exportado para outros países da América Latina, com os quais o Brasil se relaciona economicamente.

Baseado no conceito de “território” e dos fluxos que essa decisão implica, e supondo que você seja um gestor federal, cite pelo menos três aspectos que consideraria quando da decisão de conceder ou não registro a esse medicamento.

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Os objetos e os sujeitos do trabalho

As necessidades sociais de saúde e os problemas identificados informam e delimitam os objetos do processo de trabalho.

Eles devem ser conhecidos, e sobre eles é que se dá a ação das vigilâncias.

Mas como são identificados?

Sua identificação também é complexa, como são complexos os problemas de saúde.

Para conhecimento e análise dos objetos do processo de trabalho, é necessária a utilização dos enfoques indicados abaixo. Clique em cada enfoque para saber mais:

Enfoque epidemiológico
X

Identifica os problemas em grupos populacionais.

Enfoque social
X

Identifica os problemas na população tendo em vista o processo de desenvolvimento econômico, social e político que constituem os determinantes sociais dos problemas e necessidades de saúde.

Enfoque clínico
X

Identifica os problemas em sua dimensão biológica e individual.

A partir desses enfoques, identificam-se os objetos do processo de trabalho em saúde, que são, portanto, os danos, agravos, riscos e determinantes das condições de vida da população.

Por tudo o que já foi visto, é fácil concluir que não há apenas um objeto, mas vários objetos do processo de trabalho nas vigilâncias em saúde.
Para refletir

Considere estas questões de ordem prática:

  • Tendo em vista os componentes das vigilâncias em saúde, identifique ao menos dois objetos sobre os quais todas as vigilâncias podem atuar.
  • Você identifica algum objeto que seja específico de cada componente?

O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.

Assim como são vários os objetos, são múltiplas as intervenções. Cada um dos enfoques privilegia um modo de intervenção:

  • desde o diagnóstico e tratamento individuais (enfoque clínico),
  • passando pelo controle sanitário de bens e serviços de saúde, controle de vetores, ações de prevenção, educação sanitária (enfoque epidemiológico),
  • até a busca de intervenção sobre os determinantes sociais, que, como já se viu, é sempre de caráter intersetorial e multidisciplinar (enfoque social).

Ora, se os problemas e intervenções na área de promoção da saúde não se limitam ao setor saúde, o trabalho nas vigilâncias em saúde igualmente não é realizado apenas pelos profissionais de saúde.

O sujeito do processos de trabalho das vigilâncias em saúde é, portanto, coletivo. Além dos profissionais de saúde, são sujeitos da prática os profissionais de outros setores e a população ou grupos populacionais organizados.

Há uma especificidade quanto à vigilância epidemiológica em relação aos seus sujeitos ou agentes (quem a executa). Dentre as vigilâncias, ela é a que tem nos trabalhadores típicos da saúde (médicos, enfermeiros, técnicos de saúde, por exemplo) a sua principal força de trabalho. As demais vigilâncias não prescindem de outros profissionais formados fora do setor saúde: advogados, engenheiros, físicos, químicos, geógrafos etc.

Uma especificidade do sujeito da vigilância sanitária – além da questão da formação –, em relação ao das outras vigilâncias, de importância para o gestor local, é que ele precisa ser um agente público investido na função. Se ele não o for, seus atos administrativos podem ser anulados administrativa ou judicialmente.

Isto decorre do fato de seu trabalho estar submetido aos preceitos da Administração Pública, direcionado por normas jurídicas.

Os meios de trabalho

Os sujeitos das vigilâncias utilizam vários meios de trabalho para identificar seu objeto e realizar suas ações.

Salientando que o sujeito é coletivo e sua intervenção extrapola o setor saúde, é compreensível que devam lançar mão não apenas de saberes e tecnologias pertencentes ao seu campo de atuação, mas também de outros saberes e tecnologias, como a comunicação e o planejamento, conforme já foi visto anteriormente.

Alimentam-se de várias disciplinas, métodos e instrumentos para realizar suas intervenções, que não se restringem às ações meramente técnicas, mas também às ações dirigidas ao fortalecimento da sociedade e da cidadania, para alcançar sua finalidade de promoção da saúde e prevenção de danos ou agravos.

Os objetos, sujeitos e meios de trabalho estabelecem uma rede complexa de relações de trabalho e definem a organização dOs processos de trabalho das vigilâncias em saúde, que contempla duas dimensões: a político-gerencial e a técnico-sanitária.

Uma atividade unificadora de todas as vigilâncias em saúde é a atividade de investigação, onde se busca estabelecer nexos causais.

O processo investigativo, usualmente, é desencadeado por uma notificação ou denúncia.

As vigilâncias fazem, com frequência, investigação de surtos e análise de erros de processo, nas suas várias vertentes. Waldman (1998), ao discutir os usos da vigilância e da monitorização (ou monitoramento) como instrumentos de saúde pública, aponta diferenças entre eles: a vigilância analisa o comportamento de “eventos adversos à saúde” na comunidade e é uma das aplicações da epidemiologia nos serviços de saúde; a monitorização acompanha indicadores e tem aplicação em diferentes áreas de atividade, inclusive fora do setor saúde. O autor ressalta uma semelhança entre eles: é que ambos exigem três componentes: a informação, a análise e a ampla disseminação da informação analisada a todos que dela necessitam.

Essa análise/avaliação pode utilizar várias abordagens e métodos, a depender de cada uma das vigilâncias, mas também do que se quer avaliar (avaliação da qualidade dos serviços, avaliação epidemiológica dos serviços, avaliação de tecnologias em saúde etc.). Mas geralmente tem um componente laboratorial. O laboratório pode ter também o papel de “instância de perícia”, a exemplo do que ele tem para a vigilância sanitária na chamada “análise fiscal”.

WALDMAN, E. A. Vigilância em Saúde Pública. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, 1998. v.7 (Série Saúde & Cidadania).
Análise Fiscal é aquela que o laboratório público de vigilância sanitária (laboratório oficial) realiza em objetos e materiais sujeitos à vigilância (por exemplo, em medicamentos e insumos farmacêuticos) e que é destinada a comprovar a sua conformidade com a fórmula que deu origem ao registro e/ou a sua condição para uso seguro em seres humanos.

Os componentes das vigilâncias em saúde possuem algumas semelhanças e algumas especificidades no que diz respeito ao seu processo de trabalho.

É bem claro, e já foi explicitado, que o planejamento, a gestão e a comunicação são comuns e fundamentais para a intervenção em todos eles.

Igualmente importantes e comuns a todos os componentes das vigilâncias em saúde, são a produção e a utilização de informações, sem as quais a efetividade de suas ações pode ficar aquém do desejável, uma vez que a transformação de dados em informações que subsidiem as ações, que auxiliem na tomada de decisão, é peça-chave em qualquer processo de planejamento e gestão.

Não é objetivo desta unidade de aprendizagem aprofundar-se neste vasto tema, mas cabe ressaltar a importância de alguns sistemas de informação, não apenas do setor saúde, mas também de outros setores, que permitam o acesso a informações demográficas, socioeconômicas, de produção industrial, sobre o meio ambiente, sobre acidentes de trânsito etc.
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