Este módulo se propõe a apresentar os conceitos de saúde e doença mostrando como, atualmente, estas categorias complexas são entendidas, integrando um mesmo processo: o processo saúde-doença-cuidado.
Procura, também, mostrar como as diferentes características desse processo dependem do nível de organização da vida em que se manifesta.
Busca, ainda, discutir como se dão as relações entre os elementos que intervêm na determinação das condições de saúde, e como o entendimento desses conceitos é importante para a compreensão da crise atual do sistema de saúde.
Este módulo está organizado em cinco temas:
Para continuar seus estudos, siga para o Tema 1.1. Diferentes concepções de saúde.
A saúde é um tema que as pessoas sempre destacam como sendo um componente essencial de seus projetos de vida e daquilo que consideram como uma vida com qualidade.
Entretanto, quando se procura definir o que entendemos por “saúde”, invariavelmente nos deparamos com muitos desafios. Em parte, porque seu significado depende tanto do contexto histórico em que é formulado como do conjunto de valores e representações culturais dos diferentes grupos sociais. E ainda do nível de análise que estamos considerando.
Na perspectiva do conhecimento científico, a saúde é considerada uma categoria complexa, de elevado grau de abstração. Categorias desse tipo, como bem-estar, liberdade, capacidade intelectual e grau de desenvolvimento, exigem, para seu tratamento científico adequado, primeiro, uma abordagem analítica das suas diversas dimensões, e, depois, uma operação sintética capaz de apreender sua integralidade.
Até há algum tempo, todas as categorias que não podiam ser imediatamente reduzidas a variáveis, medidas ou classificadas a partir de observações empíricas, não eram consideradas apropriadas para a abordagem do método científico.
Deveriam ser objeto de outras áreas do conhecimento, como a filosofia, a arte, a religião ou o senso comum.
Na perspectiva do senso comum, entendia-se a saúde como uma condição caracterizada pela ausência de doenças. As doenças, por sua vez, embora reconhecidas pelos indivíduos a partir da dor, incapacidade ou sofrimento, deveriam, em sociedades como a nossa, ser diagnosticadas por profissionais especializados, utilizando critérios e técnicas fundamentadas cientificamente.
Na segunda metade do século XX, a saúde passou a ser destacada como uma categoria positiva, fortemente relacionada às condições de vida, mas que não deveria ser confundida com esta outra categoria complexa.
Em 1978, durante a Conferência Internacional de Atenção Primária em Saúde, da Organização Mundial de Saúde, em Alma-Ata, a declaração final reafirmou ser a saúde um “estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de doença ou enfermidade” e, ainda, um dos direitos fundamentais dos seres humanos.

Vamos realizar uma atividade de análise.
Comente o conceito de "saúde", da Organização Mundial da Saúde (OMS), destacando um aspecto que você considera positivo e outro que considera uma limitação relevante.
Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.
Você deve ter considerado como positivo um destes aspectos: a saúde como categoria distinta da doença e a saúde como categoria multidimensional abrangendo a dimensão mental (da totalidade singular), a física (orgânica) e a social.
Limitações do conceito:
Se tiver alguma dúvida, entre em contato com o tutor a fim de obter mais esclarecimentos. Caso contrário, continue seu estudo.

Que os riscos de adoecer e de morte prematura decorrem das condições de vida e, portanto, da posição do indivíduo na sociedade, isso já é bem conhecido desde o século XIX.
Já o reconhecimento da saúde como um dos direitos humanos foi uma conquista do final do século XX.
Embora as implicações desse reconhecimento ainda não tenham sido bem identificadas, ele aponta para a necessidade de uma maior especificação do que hoje estamos entendendo como saúde, e compromisso público com condições adequadas de vida.
Após esta reflexão sobre as diferentes concepções de saúde, você pode avançar para o Tema 1.2. Níveis de organização da vida e níveis de expressão dos processos saúde-doença-cuidado.
Nas últimas décadas a saúde passou a ser compreendida, cada vez mais, como uma das dimensões de um processo complexo, que se expressa de modo distinto em cada nível de organização da vida humana, sendo decorrente do processo de produção social, da autorreprodução e do desgaste dos seres humanos vivendo em sociedades.
A compreensão da saúde e da doença como dimensões de um mesmo processo inerente à reprodução da vida, percorrendo os seus diferentes níveis de organização, das células aos indivíduos e às sociedades, foi uma importante contribuição de pesquisadores latino-americanos da área da epidemiologia social (BREILH, 2003).
Assim, procurou-se superar a perspectiva tradicional, que entendia simplesmente a doença como disfunção do corpo e propunha a saúde como uma utopia, um estado ideal, levando à impossibilidade de compreendê-la na perspectiva científica.
Para Juan Samaja (2000), tratando-se de problema dos humanos, “a doença (ou normas patológicas da biologia) deixa de ser um fenômeno puramente biológico para se transformar em fenômeno institucional e simbólico”.
Ainda segundo o autor:
"saúde-doença deixa de ser um estado biológico possível vivido meramente pelos sujeitos, para se tornar um objeto da ação e da consciência de todos os membros do coletivo social: eis a essência do conceito de saúde-doença-cuidado. A representação de um estado anormal dará lugar a ações intencionalmente dirigidas a neutralizar fatores que, ao menos imaginariamente, produzem alteração da ordem representada socialmente como normal. " (SAMAJA, 2000).
O entendimento do que seja ordem, estados alterados e normalidade, relacionados às condições de saúde e doença, só faz sentido tendo como referência uma determinada visão de mundo, que inclua uma concepção do que seja a vida, e, particularmente, a vida humana.
No período atual, convivem e se opõem três diferentes visões de mundo relativas à natureza, à origem da vida, ao significado da morte, à doença e à saúde, a saber:
A ideia geral é que os seres vivos teriam sido criados por desígnio divino. A vida seria uma das manifestações da graça divina, e os projetos e as normas que devem pautá-la estariam gravados nos textos sagrados.
Atualmente, bilhões de pessoas em todo mundo elaboram seus projetos de vida e de saúde a partir dessa perspectiva, onde Deus é o centro do universo.
Sua versão mais recente é a hipótese do design inteligente, que o movimento fundamentalista norte-americano procura tornar obrigatório nos cursos de biologia.
A partir das ideias iluministas e libertárias do século XIX, a palavra “evolução” passou a ser identificada com progresso e melhoria. Para muitos pensadores daquela época, tanto as sociedades humanas “progrediam” da barbárie para a civilização, de acordo com leis históricas, como as espécies e populações também se modificavam, evoluindo sempre para novas formas mais adaptadas ao ambiente, movidas pela competição, de acordo com a teoria da seleção natural formulada por Charles Darwin.
O ser humano era ponto de referência central, a forma mais evoluída da vida, e a sociedade atual o ponto culminante do desenvolvimento histórico. Esta perspectiva humanista prevaleceu durante os séculos XIX e XX, orientando linhas de pesquisa e programas sociais voltados para o desenvolvimento econômico, e projetos de vida e saúde centrados na busca da ordem social e do equilíbrio do indivíduo com seu ambiente.
Como neste módulo iremos analisar a questão dos processos saúde-doença-cuidado na perspectiva de sistemas e organizações complexas, vamos nos deter mais detalhadamente neste enfoque. Estude, com cuidado, as próximas páginas.
Os imensos avanços realizados, nas últimas décadas, em diversas áreas científicas, como a genética, a ecologia e a informática, junto com as grandes transformações que ocorreram nas sociedades desde a década de 80 do século passado, resultaram em uma outra concepção do significado da vida.
Essa perspectiva enfatiza as características das diversas organizações complexas da vida: das células às sociedades e à biosfera, sempre em processos de transformação, fugindo do equilíbrio através da incorporação de matéria, energia e, principalmente, de informação.
Nas ciências físicas, diversas teorias já haviam procurado, durante o século XX, explorar questões que os modelos tradicionais, fundamentados na mecânica e na matemática clássica, não conseguiam equacionar.
Por exemplo, a mecânica quântica, a termodinâmica, o conceito do Big-Bang e a Teoria do Caos resultaram em uma visão do mundo muito diferente do universo ordenado e previsível das ciências tradicionais e do senso comum.

Nas ciências da vida e da saúde, a questão da complexidade foi incorporada mais tarde, já na segunda metade do século XX, quando os conceitos de sistemas, organização e autorregulação, da cibernética, impuseram a concepção de vida como processo.
Neste período, a identificação do código genético integrou as ciências biológicas e a área da informação, identificando, como componentes concretos das organizações complexas, além das formas (os objetos materiais), as funções, os processos e as estruturas.
Uma referência pioneira neste campo foi o livro de Jean Piaget (1967), Biologia e Conhecimento, que propôs uma visão construtivista do desenvolvimento das organizações vivas, através da incorporação e acumulação de informações.
No construtivismo, considera-se que todo o desenvolvimento das organizações da vida decorre da incorporação de novas informações às estruturas de informações pré-existentes. Isso leva à sua transformação e a novas possibilidades de incorporação de informação e mudança estrutural, e assim sucessivamente.

Todos os seres vivos são completamente dependentes das interações que conseguem estabelecer com os outros e com o ambiente modelado pela vida nas gerações anteriores.
Os seres humanos, além disso, como todos os primatas e diversos outros animais, só conseguem sobreviver integrando grupos sociais, constituídos de indivíduos da sua espécie.
O desenvolvimento histórico das relações sociais e das técnicas possibilitou a emergência de novas formas de organização em sociedades e, finalmente, de um modo de produção social e reprodução da vida humana que resultou em uma população de mais de seis bilhões de indivíduos, ocupando todos os continentes e modificando todos os ecossistemas da biosfera.
Como propôs Juan Samaja (2000), o processo saúde-doença-cuidado, sendo expressão da dinâmica do processo de reprodução e desgaste dos humanos, precisa ser analisado em diferentes níveis de organização em que este se manifesta: como coletivos de células – ou organismos, como indivíduos singulares, como coletivos de indivíduos humanos interagindo – os grupos sociais e como sociedades complexas.
Agora você pode avançar para o Tema 1.3. A natureza complexa e multidimensional da saúde e da doença.

"A realidade natural e social em que vivemos, e com a qual trabalhamos, é complexa, composta de inúmeros objetos, seres e processos. No entanto, esta complexidade não é anárquica e possui uma organização, uma arquitetura, que mantém relação com os processos que deram origem a esses objetos e seres e que explica (...) as qualidades e os comportamentos de cada um deles. " (CASTELLANOS, 1997).
O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.
Observe com atenção a figura a seguir.

Essa figura mostra, de modo esquemático, os níveis de expressão do processo saúde-doença-cuidado nos diferentes níveis de organização da vida humana, e como, no nível individual, as doenças sempre apresentam simultaneamente três dimensões:
Os processos saúde-doença-cuidado percorrem todos os níveis, apresentando características distintas em cada um deles.
Em um mesmo nível, os processos podem ser considerados em suas diferentes dimensões. Por exemplo, no espaço social, temos as dimensões do território e da sociedade. No nível individual, temos simultaneamente um organismo (coletivo de células), o cidadão (unidade da sociedade) e o indivíduo singular, único.
Os diferentes níveis estão inter-relacionados através de processos que fazem a mediação entre eles.
A compreensão do processo saúde-doença-cuidado, concretizando-se em diferentes níveis, fica complicada porque, comumente, utilizamos um mesmo termo para expressar conceitos muito diferentes.
Por exemplo, utilizamos o termo “tuberculose” para:
Diferentes disciplinas científicas têm a tuberculose como seu objeto de pesquisa. Dependendo do nível de análise, a microbiologia, a clínica, a epidemiologia e as ciências sociais aportam contribuições relevantes para seu conhecimento, mas nenhuma consegue apreender a integralidade de um problema de saúde.
Para a compreensão de um problema de saúde, em suas diversas dimensões, impõe-se uma abordagem interdisciplinar.
Mas, além disso, para orientar ações de controle e cuidado, precisamos selecionar o nível de atuação mais indicado, pois cada nível tem características próprias, e a efetividade das intervenções depende de acumulações de conhecimento e de poder distintas.
Agora você pode avançar para o Tema 1.4. Relações de determinação nos processos saúde-doença-cuidado nos níveis individual, coletivo e social.
Cada nível de organização se define por sua autonomia e integralidade, mas contém e está contido em níveis de outra ordem, como caixas chinesas, relacionados por processos que estabelecem as conexões de determinação nas três direções:
Observe com atenção a figura a seguir:

Nesse modelo, destacamos, como características das organizações complexas: a presença de diversos níveis, a recursividade entre eles (do tipo X determina Y, mas Y também determina X), e a condição de incerteza e opção, quando as características do nível singular selecionam, entre diversas possibilidades, aquela que vai se concretizar.
O conceito de determinação aqui utilizado não deve ser confundido com a noção de determinismo presente nas ciências tradicionais, físicas, biológicas e sociais, que buscaram na mecânica a referência para seus princípios de causalidade.
Hoje, reconhecemos que, nas ciências da vida, a possibilidade de escolha, por opção ou por acaso, e em todos os níveis, é uma característica fundamental e a principal fonte de diversidade e complexidade.
Os determinantes das doenças – que se manifestam como problemas de saúde no nível individual – ocorrem neste nível e em todos os outros: no nível coletivo (dos grupos sociais), como processos endêmico-epidêmicos e no nível das formações socioespaciais.
Neste último nível, eles se expressam como problemas de saúde pública, na interface entre o Estado e a Sociedade, entre o particular e o público. E podem ser analisados como processos relacionados à reprodução das populações, como elemento dos processos de produção e de consumo, como crises e possibilidades de controle social, ou também como questão relativa aos direitos humanos e à cidadania.
De qualquer forma, sempre na interseção de duas lógicas: a lógica da reprodução do capital e a da reprodução da vida.
Por exemplo, entre os fatores diretamente relacionados com a morte por diarreias infecciosas em crianças estão:
Essas variáveis, sendo todas do nível individual, estão relacionadas entre si e com outras de outros níveis:
Observe o esquema a seguir (modelo lógico), organizado com base nas variáveis identificadas no texto da página anterior. Ele apresenta uma sequência de níveis de determinação até o caso de diarreia (doença individual).


Alguns processos são particularmente relevantes por estabelecerem relações de determinação entre categorias (do mundo concreto) e variáveis (das nossas análises empíricas), permitindo explicitar as conexões entre os níveis, de modo distinto, em diversas situações.
Assim, na conjuntura atual, as políticas habitacionais e de saneamento são categorias mediadoras entre as políticas socioeconômicas (gerais) e as condições de vida (particulares) que resultam em risco de morte para crianças específicas (singulares).
Já a escolaridade da mãe, que depende das políticas educacionais e das condições socioeconômicas da sua família, pode ser uma das categorias mediadoras que vão especificar quais crianças vão morrer, entre muitas do mesmo grupo social e do mesmo lugar, atuando sobre os cuidados da criança, o acesso aos serviços e o padrão de fecundidade.


Vamos realizar uma atividade de análise.
O cuidado em relação a um problema de saúde também pode se expressar em diferentes níveis de organização da vida. Utilizando ainda a tuberculose, descreva dois cuidados pertinentes aos níveis individual, coletivo e social.
Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.
Nível individual: aumento da resistência à infecção e à doença (imunização, alimentação adequada, redução da intensidade do desgaste no processo de trabalho); tratamento adequado dos casos.
Nível coletivo: redução da força de transmissão: habitação adequada, diagnóstico precoce dos casos, redução de risco de doença ocupacional, programas de segurança alimentar, acompanhamento dos doentes nas comunidades e nas famílias, práticas educacionais relacionadas a este problema de saúde; construção compartilhada de concepções, representações e valores relativo à tuberculose, envolvendo pesquisadores, profissionais de saúde e comunidades; atenção orientada a grupos mais vulneráveis da sociedade (moradores de rua, alcoólatras, imunodeprimidos).
Nível da sociedade: políticas públicas orientadas à redução da desigualdade (equidade); política de geração de renda e emprego; identificação da tuberculose como problema de saúde prioritário; políticas de saúde orientadas ao controle integrado da tuberculose; políticas de segurança alimentar.
Se tiver alguma dúvida, entre em contato com o tutor a fim de obter mais esclarecimentos.
Para todas as organizações complexas, sua reprodução no tempo e o seu desenvolvimento, com acumulação de informação e aumento da complexidade, são processos inexoráveis, limitados apenas pelo desgaste e pela eventual desintegração dessas organizações da vida.
Para assegurar isto, são essenciais os processos de controle, tanto internos – a autorregulação, como externos – controles verticais. A ocorrência de múltiplos centros de controle conectados de modo não linear (do tipo A determina B, mas B também determina A) resulta em mecanismos de regulação com retroalimentação, que permitem um ajuste fino, permanente, mas nunca estável, tranquilo.
Eles nunca estão em equilíbrio estático, mas, como uma bicicleta em movimento, em permanente condição de equilibração.
Ao contrário, as tensões e as crises são inerentes e inevitáveis, e podemos considerar um indicador da integridade das organizações complexas sua capacidade de dar respostas adequadas a esses desafios.
A capacidade de dar respostas adequadas aos desafios é inerente a todas as organizações da vida, mas para as organizações humanas, em todos os seus níveis, existe uma diversidade de opções muito maior, mediadas por nossas acumulações históricas, culturais, científicas e éticas.
Essa aptidão para a adaptação e superação de problemas é que permitiu, contrastando com a homogeneidade biológica, o enorme aumento da população humana, sua ampla dispersão territorial e sua grande diversidade cultural.

Para os humanos vivendo em sociedades, os problemas de saúde têm sempre determinações históricas e sociais, e as possibilidades de resposta – regulação, controle e cuidado – também são definidas no contexto histórico, social e cultural.
Mas o que entendemos por determinantes sociais de saúde (DSS)?
Os determinantes sociais da saúde (DSS) incluem as condições mais gerais socioeconômicas, culturais e ambientais de uma sociedade, e relacionam-se com as condições de vida e trabalho de seus membros, como habitação, saneamento, ambiente de trabalho, serviços de saúde e educação, incluindo também a trama de redes sociais e comunitárias.
Esses determinantes influenciam os estilos de vida, já que as decisões relativas, por exemplo, ao hábito de fumar, praticar exercícios, hábitos dietéticos e outras estão também condicionadas pelos DSS.

Para saber mais, acesse a reportagem Saúde e determinantes sociais no território federativo, da Professora Patricia Ribeiro, disponível no site do projeto Saúde Amanhã, no portal da Fiocruz.
Leia também o texto de Paulo Buss, Promoção da saúde e qualidade de vida (2000), publicado na revista Ciência e Saúde Coletiva. Este texto encontra-se na biblioteca do curso.
Com isso, encerramos o estudo deste tema. Agora, você pode avançar para o Tema 1.5. Características da crise da saúde.
Nos anos recentes, vem se expressando, por toda parte, um sentimento de que os problemas de saúde estão se acumulando e os modelos assistenciais não conseguem mais responder nem às expectativas das pessoas nem às necessidades da sociedade.
No Brasil, junto com o desemprego e a violência, a questão da saúde sempre aparece com destaque entre as preocupações identificadas como problemas prioritários, quando são realizados levantamentos nos diversos grupos populacionais.
Os meios de comunicação expõem, diariamente, as limitações e, mesmo, absurdos que se acumulam no atendimento prestado pelos serviços de saúde, enfatizando os dramas individuais e colocando em questão sua função social.
Mesmo entre os profissionais do campo da saúde pública, generaliza-se a impressão de que uma crise profunda percorre sua área de atuação, fazendo com que muitos dos conceitos e recursos técnicos até há pouco tempo valorizados pareçam obsoletos, resultando na disseminação de um sentimento crescente de mal-estar, que dificulta a possibilidade de identificação de propostas alternativas capazes de recuperar a efetividade do setor.
Esse sentimento de crise parece paradoxal quando se considera os impactos causados, neste século, pelos modelos de atenção à saúde, individual e coletiva, como o aumento progressivo da duração média da vida, em níveis inéditos na história, e a extensão lenta e continuada do acesso a cuidados médicos e condições de saneamento a muitos grupos populacionais, antes excluídos.

Leia o capítulo Esboços para um cenário das condições de saúde da população brasileira 2022/2030 (BARRETO, 2013) para compreender o aumento da expectativa de vida a partir de uma análise histórica sobre as condições de saúde da população brasileira.
Esse texto compõe o livro Saúde no Brasil em 2030: diretrizes para a prospecção estratégica do sistema de saúde brasileiro, (FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ, 2012) disponível no site do projeto Saúde Amanhã, no portal da Fiocruz.

Vamos realizar uma atividade de análise.
No gráfico visto na tela anterior, identifique três observações que se destacam e precisam ser analisadas mais cuidadosamente, se quisermos compreender a evolução da expectativa de vida ao nascer dos seres humanos, durante sua presença na biosfera. Justifique.
Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.
Expectativa de vida ao nascer muito baixa, cerca de 20 anos, nas populações de caçadores coletores, apesar da sua reconhecida adaptação ao meio ambiente.
A redução da expectativa de vida (em torno de 10%) com o desenvolvimento da agricultura (sedentarismo, densidade populacional, estratificação social).
Expectativa de vida ao nascer baixa, menor do que 30 anos, nos impérios clássicos (Grécia e Roma) apesar do imenso desenvolvimento político, econômico e social registrado nessas sociedades antigas.
Pequeno aumento da expectativa de vida ao nascer após a implantação do capitalismo, quando o indicador é comparado ao período medieval.
Grande e continuado aumento da expectativa de vida no século XX, passando de 50 para 80 anos de idade, na Europa.
Se tiver alguma dúvida, entre em contato com o tutor a fim de obter mais esclarecimentos.

Por outro lado, o potencial de desenvolvimento científico e tecnológico das práticas de atenção à saúde, possibilitado pelas recentes e revolucionárias transformações nas ciências biomédicas, a partir da generalização da aplicação da engenharia genética, da biotecnologia, da nanotecnologia e da informática, abre um leque de possibilidades que, há poucas décadas, não eram sequer imaginadas.
Apesar dos avanços sociais, tecnológicos e científicos, a constatação de que a crise da saúde é concreta se impõe, e nos obriga a analisar suas atuais características, determinantes e possibilidades de desdobramento, a partir de uma perspectiva que não reduza a complexidade do problema apenas às limitações dos atuais modelos assistenciais.
Essa explicação simplificadora, disseminada reiteradamente pelos meios de comunicação de massa e incorporada ao senso comum, acaba assumindo, como causa, o que é um efeito, e bloqueia uma visão mais construtiva do problema.

Estamos vivendo uma crise da concepção de saúde ou uma crise do sistema de saúde?
Assista ao filme Sicko - $O$ Saúde feito por Michael Moore, em 2007, que fala sobre o Sistema de Saúde dos Estados Unidos da América. O documentário aborda a saúde por seu lado inverso, o da doença, mas não em seus aspectos biológicos, e, sim, sociais e éticos. Discute a questão da seguridade social e saúde nos Estados Unidos, revelando as contradições entre a riqueza do país e a má qualidade de vida decorrentes da desorganização dos setores da assistência médica pública e privada, na lógica capitalista de manutenção dos lucros das seguradoras de saúde. Apresenta como outra possibilidade o que ele denomina medicina socializada, exemplificada pelos sistemas médicos canadense, inglês e francês.
O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.
Nas análises de crises de sistemas e organizações complexas, temos que considerar a sua natureza e sua forma de expressão.
Em relação à natureza das crises, identificamos aquelas que decorrem do esgotamento da sua dinâmica e resultam em desordem, ou redução da complexidade da organização em relação à condição anterior.
E outras que, ao contrário, retratam a instabilidade dos sistemas, quando, em consequência de processos de acumulação e desenvolvimento, estão em transformação para uma outra ordem de maior complexidade.
Quase sempre isto decorre de defasagem no tempo que as diferentes estruturas levam para mudar.
Quanto às formas de expressão, pode-se destacar, além da crise financeira, que é sempre a mais discutida, as crises por redução da resolutividade das práticas.
Paradoxalmente, o aumento do acesso aos novos recursos tecnológicos de alta complexidade não parece suficiente para assegurar bem-estar e qualidade de vida. E a maior extensão da vida, muitas vezes, pode representar apenas maior prevalência de doenças, incapacidade e sofrimento.
Há uma nova percepção de que as grandes transformações que ocorreram nas organizações sociais resultaram no aumento da vulnerabilidade da saúde das pessoas e das sociedades.
Na medida em que aumentam a expectativa de vida e a exposição a novos determinantes de desgaste, as práticas médicas, que tinham sido extremamente eficazes na prevenção e no tratamento das doenças anteriormente prevalentes, não são mais capazes de resolver, por si só, os novos problemas de saúde.

No nível coletivo, a vulnerabilidade pode ser vista como “a interação entre o risco existente em um determinado lugar e as características e o grau de exposição da população lá residente” (ALVES, 2006).
Para o indivíduo e o grupo social, a noção de vulnerabilidade extrapola a simples noção de risco. Além de ser definida como uma situação em que estão presentes três elementos – a exposição ao risco, a incapacidade de reação e a dificuldade de adaptação diante da materialização do risco (MOSER, 1998) –, ela também indica a ampliação das chances e formas de acometimento pela doença pela totalidade do sujeito ou grupo da população (CARMO; GUIZARDI, 2018).
No nível da organização social, a vulnerabilidade apresenta duas dimensões integradas: a vulnerabilidade social, definida através da constatação de grupos populacionais excluídos, submetidos a grande privação em relação ao acesso a bens e serviços, e a vulnerabilidade ambiental, definida pela presença de áreas de risco e degradação ambiental (ALVES, 2006).
O conceito de vulnerabilidade, relacionado ao conceito de determinantes sociais de saúde, amplia a compreensão do processo saúde-doença para além do paradigma biológico, ao considerar, de forma mais ampla, “os múltiplos fatores que incidem no cotidiano de vida dos sujeitos em seus territórios, contribuindo para a promoção ou deterioração dos seus estados de saúde” (CARMO; GUIZARDI, 2018).

Para saber mais sobre vulnerabilidade, acesse os textos Os conceitos de vulnerabilidade e adesão na Saúde Coletiva (BERTOLOZZI et al., 2009) e O conceito de vulnerabilidade e seus sentidos para as políticas públicas de saúde e assistência social (CARMO; GUIZARDI, 2018), também disponíveis na Biblioteca do curso.
Vamos observar alguns determinantes do aumento da vulnerabilidade das condições de vida e saúde.
Clique nas setas laterais, nos quadros abaixo, para rolar toda lista de determinantes que caracterizam a situação de vulnerabilidade do período atual.
Alguns desses determinantes, como a “persistência de bolsões de miséria”, podem ser equacionados a partir de políticas sociais adequadas.
Outros, entretanto, decorrem do novo modo de vida e suas relações com os processos de produção e de consumo, ou são resultado direto do modelo de desenvolvimento social e econômico implantado, em toda parte, mesmo que de modo desigual, no século XX.
Já se pode constatar que esse modelo se aproxima de seus limites, e que mudanças profundas deverão ocorrer nas próximas décadas. Até que isto aconteça, a vulnerabilidade individual, coletiva, socioespacial e global, continuará aumentando, pois os seus determinantes são, em grande parte, resultantes ou componentes fundamentais do atual processo de produção e reprodução social.
Então, passou a ser fundamental não só aos serviços de saúde, mas também aos indivíduos, às famílias, aos grupos sociais e às organizações sociais, priorizarem a dimensão do cuidar da saúde, minimizando os riscos, aumentando a competência em lidar com eles, promovendo as mudanças possíveis e buscando a redução do sofrimento.

Vamos realizar uma atividade de análise.
Na sua percepção, a crise da saúde no Brasil decorre, predominantemente, do esgotamento do modelo? Ou resulta da instabilidade devida ao desenvolvimento da sociedade?
Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.
A crise atual decorre essencialmente do modelo de desenvolvimento que prevaleceu nas últimas décadas.
Na medida em que diversos problemas foram resolvidos, outros mais complexos foram aparecendo, impondo à sociedade e ao sistema de saúde a busca de novas soluções.