Módulo 1Introdução às gerências de operações e recursos

Introdução

O ponto de partida para uma boa gestão de recursos e operações é entender que as organizações de saúde são sistemas produtivos, cujos produtos (que embora costumam ser considerados “serviços”, em geral implicam combinações de bens e serviços) têm valor e impacto econômico e social. Como em qualquer serviço, seu foco deve ser a prestação de serviços individuais ou coletivos às pessoas.

Lamentavelmente, no Brasil, a maioria dos serviços de saúde ainda leva pouco em conta a perspectiva da gestão de operações ao organizar a oferta de serviços. Há uma tendência em se trabalhar com planejamentos abstratos, utilizando a lógica de gerências de recursos estanques e dissociadas das gerências assistenciais, com pouca atenção ao desenho das operações.

Com isso, toda a logística da oferta de serviços de saúde fica prejudicada.

E essa dificuldade não é um “privilégio” do sistema público...

Este módulo está organizado em seis temas:

  • Tema 1.1. Atividades e funções de atenção à saúde
  • Tema 1.2. Produção, fatores de produção e processos produtivos em saúde
  • Tema 1.3. Bases organizacionais das operações em sistemas e serviços de saúde
  • Tema 1.4. Conceitos introdutórios em gerências de operações
  • Tema 1.5. Gerenciamento da capacidade instalada
  • Tema 1.6. Gerenciamento de filas e esperas

Para continuar seus estudos, siga para o Tema 1.1. Atividades e funções de atenção à saúde.

Tema 1.1Atividades e funções de atenção à saúde

Uma atividade é um conjunto de operações realizadas de modo contínuo e permanente, visando a operacionalidade e manutenção da organização e de sua produção.

Uma atividade ocorre pela combinação de:

  1. Recursos: equipamentos, trabalho, insumos etc.
  2. Know how operacional: técnicas de produção.
  3. Redes de informação: para gerar a produção de bens e serviços específicos.

Atividades envolvem um processo de transformação, constituído por inputs (entradas), que sofrem um processo de transformação, resultando em produtos ou serviços que são os outputs (saídas).

Um agregado de atividades de natureza semelhante compõe uma função. Veja a figura abaixo:

Na classificação de funções de atenção à saúde, do arcabouço proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para elaboração das Contas Nacionais de Saúde, a OMS reconhece as funções abaixo como sendo de atenção à saúde. Clique em cada item para saber mais:

Serviços de atenção curativa
X

Exemplos de atividades nesse grupo incluiriam as atividades curativas nas várias especialidades realizadas em hospitais, ambulatórios, urgência ou emergência, emergência pré-hospitalar e atenção curativa em hospitais-dia e UTIs.

Serviços de reabilitação
X

Exemplos de atividades nesse grupo seriam o atendimento de reabilitação para doenças crônicas, idosos, saúde mental, e outros, realizados em diversos ambientes.

Serviços de enfermagem de longa duração
X

Esses serviços têm crescido bastante no mundo em função do envelhecimento da população. As atividades incluiriam, por exemplo, cuidados de enfermagem realizados em lares para idosos, estabelecimentos para cuidados prolongados e lares para deficientes físicos e mentais.

Serviços auxiliares de atenção à saúde
X

Abrangeriam os conhecidos “Serviços de Apoio Diagnóstico e Terapêutico” – exames de laboratório, imagem, endoscopias, entre outros – e serviços de transporte médico.

Dispensão ambulatorial de produtos médicos
X

Inclui serviços de farmácias, públicas e privadas, na venda de medicamentos e de outros produtos médicos, e lojas de venda de dispositivos terapêuticos – como lentes oculares, muletas, óculos, cadeiras de rodas e aparelhos auditivos, por exemplo.

Prevenção e outros serviços de saúde coletiva
X

Inclui vacinação, serviços de saúde materno-infantil, controle de vetores, vigilância epidemiológica, ações de promoção da saúde, entre outros.

Administração da saúde e seguros de saúde
X

Inclui a regulação da oferta de serviços, gerenciamento de serviços de saúde, organização de programas de saúde pública e administração de planos de saúde, por exemplo.

Os modelos de atenção constituem combinações de mecanismos de regulação e financiamento com diferentes participações dessas várias funções de atenção à saúde, o que gera diferentes portfólios de oferta de serviços.

Nos países da Comunidade Europeia, por exemplo, a função de serviços de enfermagem de longa duração é bastante desenvolvida e acompanhada pelo sistema de saúde, enquanto no Brasil há poucos registros sobre ela.

Nos países da África, há pouquíssima oferta de serviços auxiliares de atenção, enquanto nos Estados Unidos eles respondem por 15 a 20% dos gastos do país com saúde.

Serviço de atenção à saúde na Europa
Serviço de atenção à saúde no Brasil
Serviço de atenção à saúde no Brasil
Serviço de atenção à saúde na África
Serviço de atenção à saúde nos EUA
Atividade de autoavaliação

Vamos encerrar o estudo deste tema com uma atividade de análise.

Suponha um asilo para pessoas idosas que receba principalmente clientes com incapacidades físicas ou psíquicas e ofereça vacinas para gripe, acompanhamento médico regular e de intercorrências médicas e atividades de lazer. Esse asilo está exercendo atividades típicas de quais funções de saúde?

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.  

Comentários
A resposta foi salva em seu navegador com sucesso!
Não foi possível salvar o que escreveu. Copie, cole e salve seu texto de forma que possa consultá-lo posteriormente.

Agora, você pode avançar para o Tema 1.2. Produção, fatores de produção e processos produtivos em saúde.

Tema 1.2Produção, fatores de produção e processos produtivos em saúde

GREMAUD, A.P.; TONETO Jr., R.; VASCONCELLOS, M.A.S. Economia Brasileira Contemporânea. São Paulo: Atlas, 2007.

Na linguagem econômica, produção é a “atividade social que visa adaptar a natureza para a criação de bens e serviços que permitam a satisfação das necessidades humanas.” (GREMAUD; TONETO JR.; VASCONCELLOS, 2007, p.32).

Portanto, tanto bens quanto serviços podem ser genericamente denominados produtos. Toda a produção está assentada em uma estrutura produtiva, em geral com regulamentação definida por lei, e é sustentada por “fatores de produção” e “processos produtivos”.

Vejamos cada um desses conceitos.

Linha de produção de uma fábrica
Atendimento em um posto de saúde
Vendedora atendendo clientes em uma loja
Atendimento em um banco ou financeira
Terra, Capital, Trabalho
Fatores de produção

Fatores de produção são os recursos demandados para a produção de bens e serviços.

Os economistas costumam categorizar os fatores de produção em três grandes áreas: terra, capital e trabalho.

Por analogia e nos afastando um pouco do rigor conceitual dos economistas, poderíamos didaticamente considerar que, nas atividades de atenção à saúde, esses fatores incluem:

  • Instalações e equipamentos (recursos fixos);
  • Recursos financeiros;
  • Recursos humanos;
  • Insumos (matéria-prima, materiais e/ou outros serviços necessários de apoio para a produção do bem ou serviço).
Atividade de autoavaliação

Vamos fazer um exercício de comparação.

Compare os fatores de produção exigidos na indústria farmacêutica com aqueles exigidos na oferta de consultas médicas.

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.

Comentários
A resposta foi salva em seu navegador com sucesso!
Não foi possível salvar o que escreveu. Copie, cole e salve seu texto de forma que possa consultá-lo posteriormente.
Processos de produção

As atividades de produção de bens e serviços de saúde podem ser caracterizadas por seus processos de produção.

Os processos de produção abrangem as formas de organização do trabalho e os vários graus de incorporação tecnológica.

Os processos de produção desenvolvidos por uma indústria podem ser organizados de formas distintas, conforme veremos a seguir.

Os processos de produção podem ser classificados em dois tipos. Clique em cada tipo de processo para saber mais:

Processos com lógica industrial
X

São processos similares à manufatura, onde os bens físicos predominam sobre os produtos “intangíveis” e difíceis de definir, característicos dos serviços.

Há pouco contato com o cliente.

Prevalece a lógica de redução de custos pelo emprego de tecnologia, produção em massa, automação e especialização. A divisão do trabalho é realizada no sentido de reduzir ou eliminar o fator humano, sempre suscetível a erros.

Processos de manufatura são característicos da produção de medicamentos e outros insumos médico-hospitalares, mas também se aproximam dos processos empregados em alguns segmentos especializados da atenção à saúde, como a fase analítica do processamento de exames diagnósticos de análises clínicas de laboratório, cada vez mais executada em estruturas do tipo “plantas de processamento”.

Processos com lógica de serviços
X

O desempenho da organização está inexoravelmente ligado às necessidades e expectativas do cliente. O fator humano (cliente e empregado/profissional), a tecnologia, a produtividade e a qualidade precisam ser equilibrados.

Predomina a orientação para processos e os empregados/profissionais são considerados um recurso organizacional.

Processos que têm o cliente como participante: Verifica-se um grau elevado de envolvimento do cliente. Bens físicos podem ou não ser parte significativa do serviço, e os serviços podem ser personalizados ou padronizados. Exemplos: vendas em uma loja de departamentos, consulta médica etc.

Processos que têm o paciente como produto: O serviço é realizado no próprio cliente. Bens físicos podem – ou não – fazer parte do produto final, e os serviços são personalizados. Exemplos: serviços de cabeleireiro, procedimentos cirúrgicos etc.

Atividade de autoavaliação

Vamos fazer outro exercício de comparação.

Compare os processos de produção da indústria de equipamentos médicos com os de uma consulta em fisioterapia.

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.

Comentários
A resposta foi salva em seu navegador com sucesso!
Não foi possível salvar o que escreveu. Copie, cole e salve seu texto de forma que possa consultá-lo posteriormente.

Com isso encerramos o estudo deste tema. Agora, você pode avançar para o Tema 1.3. Bases organizacionais das operações em sistemas e serviços de saúde.

Tema 1.3Bases organizacionais das operações em sistemas e serviços de saúde

A análise das organizações de saúde como sistemas produtivos permite entrever uma distinção entre dois grupos de atividades. Clique em cada grupo para saber mais:

Atividades ligadas ao processo de cuidado ou atenção
X

Este grupo fica a cargo das gerências assistenciais, cujo objetivo é o gerenciamento do cuidado, ou seja, a coordenação e execução das ações dos profissionais durante um procedimento ou intervenção, que envolve conhecimento específico dos profissionais de saúde; estas atividades compreendem a definição de tecnologias empregadas e um know-how profissional de cuidados.

Atividades ligadas ao processo logístico
X

Este grupo fica a cargo das gerências de recursos e gerências de operações.

As gerências de recursos, habitualmente denominadas gerências administrativas, são responsáveis por garantir a disponibilidade de todos os fatores de produção, ou seja, dos recursos financeiros, humanos, materiais, de informações e a manutenção da infraestrutura. Uma gerência de recursos competente precisa ter familiaridade com as indústrias componentes, o mercado de trabalho e aspectos ligados ao financiamento e regulamentação do setor de saúde, além de uma atuação muito afinada com as gerências de operações e assistenciais.

As gerências de operações, por sua vez, são responsáveis por garantir o estabelecimento de arranjos articulados desses recursos com as atividades de cuidado ou atenção. Assim, as operações de um serviço pressupõem a organização do processo produtivo, de tal forma que o cliente tenha acesso ao serviço que buscou, ou do qual necessita, e que esse serviço seja oferecido com a melhor qualidade possível.

Compreende um know-how operacional, que pressupõe familiaridade com os processos de produção de serviços, e um trabalho integrado com as gerências assistenciais e de recursos.

Tanto as gerências de recursos quanto as de operações precisam dominar conhecimentos externos à área da saúde, e esses conhecimentos precisam ser adequados ao contexto do desenvolvimento das atividades de saúde.

Em resumo, do ponto de vista gerencial, a produção das atividades de prestação de serviços, nas organizações de saúde, poderia ser representada da seguinte forma:

Gerenciamento do cuidado
Gerências médico-assistenciais
Gerenciamento dos processos produtivos
Gerências de operações de serviço
Gerenciamento dos fatores de produção
Gerências de recursos

Entretanto, o que geralmente encontramos nas organizações de saúde resume-se a uma direção médico-assistencial, que coordena as chamadas “atividades finalísticas”, e uma direção administrativa, que coordena os recursos organizacionais, nas chamadas “atividades logísticas”, de forma isolada e estanque das atividades de cuidado.

O fato de, historicamente, não haver uma efetiva integração entre os dois setores dificulta muito o estabelecimento de uma gerência de fato logística ou de operações nas organizações de saúde.

Além disso, a maior visibilidade do processo de cuidado para os profissionais de saúde, que habitualmente são os gestores de organizações de saúde no Brasil, faz com que o processo logístico seja frequentemente negligenciado, e tenha um baixo nível de profissionalização.

Os organogramas que separam as gerências assistenciais das administrativas reforçam ainda mais o tradicional afastamento das duas áreas.

Muito bem. Com isso concluímos o estudo deste tema. Agora você pode avançar para o Tema 1.4. Conceitos introdutórios em gerências de operações.

Tema 1.4Conceitos introdutórios em gerências de operações

Em geral, nos serviços de saúde, é mais fácil para o cliente avaliar a qualidade das operações de serviço do que a qualidade do cuidado.

Por exemplo, um paciente internado para submeter-se a uma colecistectomia, em geral não tem conhecimento, tempo, oportunidade ou condições de avaliar a qualidade da colecistectomia (ou do cuidado), e fica sem saber se a cirurgia correu 38% bem ou 98% bem.

Mas o cliente e a família conseguem perfeitamente avaliar a qualidade das operações de serviços, que incluiria o tempo que o cliente levou esperando fora do centro cirúrgico, a facilidade ou dificuldade para virem colher seus exames pré-operatórios, a presteza da equipe de saúde ou a velocidade dos processos de internação e alta.

Normalmente, a qualidade do cuidado é denominada pelos profissionais de saúde de qualidade clínica, e depende:

  • das qualificações de quem presta o serviço;
  • do uso correto do equipamento diagnóstico;
  • da seleção, cronologia e sequência adequada dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos.

A qualidade das operações de serviços é muito pouco pesquisada na literatura de saúde, e depende da competência para executar atividades logísticas.

Entretanto, pode ter impactos significativos sobre a qualidade do cuidado.

Por mais que seja inegável que a qualidade do cuidado precisa ser o ponto de partida da avaliação da qualidade, falhas na qualidade das operações de serviço, além de serem imediatamente percebidas pelo cliente, podem comprometer a excelência da qualidade do cuidado, e ter grande impacto nos custos de uma organização.

Esse é um dos paradoxos das atividades de atenção à saúde.

Os produtos ou serviços oferecidos por uma organização de saúde podem ser avaliados em pelo menos dois planos:

Qualidade do cuidado ou clínica

A qualidade do cuidado é intrínseca ao produto (seja ele uma consulta ou uma cirurgia) ofertado ao cliente, sendo, fundamentalmente, uma responsabilidade das pessoas ligadas ao processo de cuidado ou atenção (gerências assistenciais).

Qualidade das operações de serviço

A qualidade das operações de serviço corresponde à forma como esse produto é apresentado ou administrado, e é determinada principalmente pelas atividades do núcleo logístico (gerências de recursos e operações).

Veja esse exemplo:

Detalhes tão pequenos...

Um paciente permanece por duas horas na porta do centro cirúrgico, esperando ser levado à sala de cirurgia, porque a mesma ainda não foi limpa; em função do estresse acarretado pela espera, apresenta um pico hipertensivo. Portanto, a qualidade clínica de seu atendimento foi comprometida por uma falha no processo logístico. A cirurgia então é suspensa.

Pense nos prováveis desdobramentos desse aparente “detalhe”, que corresponde a uma falha de operações...

O adiamento da cirurgia pode piorar o prognóstico do paciente, o que é um desdobramento que compromete ainda mais a qualidade clínica do atendimento. Pode também fazer com que ele fique internado mais tempo do que o necessário, pois será preciso encaixá-lo novamente no Mapa Cirúrgico.

Pense no que isso implica: danos à saúde e à vida pessoal do paciente, despesas provocadas pelo aumento do tempo de internação (alguém paga por elas) e custos de manter a equipe cirúrgica ociosa por esse tempo.

Poderíamos considerá-los, também, “detalhes”?

É desses e outros “detalhes” que se ocupa a gerência de operações.

A gerência de operações é a responsável por supervisionar todo o conjunto de “grandes” e “pequenas” operações que viabilizam as atividades produtivas de uma organização.

Ao contrário de algumas funções da gestão (como o planejamento e a avaliação, por exemplo), as tarefas das gerências de operações e recursos são basicamente definidas pelos desafios imediatos gerados pela necessidade de prestar os serviços de saúde, ou seja, de fazer acontecer.

Conceito de operação

Em sentido amplo, operação está para serviços assim como fabricação está para bens manufaturados.

O movimento da Gestão da Qualidade Total (Total Quality Management – TQM) instituiu a ideia de que as operações devem perseguir os objetivos de melhorar os serviços, com qualidade, variedade e capacidade de resposta, simultaneamente reduzindo os custos.

Por isso, todos os níveis e segmentos de gerência passam, cada vez mais, a considerar que podem aprender com as ideias da gerência de operações.

Mas o que é uma “operação”?
Seja para médicos ou militares, uma operação é uma forma deliberada de executar uma ação, que implica uma sequência específica de etapas ou processos, com vistas a atingir um objetivo.
Na linguagem administrativa, “operação” é uma forma de organizar a produção de um serviço.

Assim, a gerência de operações ocupa-se da melhor forma de organizar as atividades produtivas, e de garantir que essas atividades sejam desempenhadas sem interrupções não programadas.

As operações podem ser contínuas ou pontuais:

Operações contínuas

Neste caso tendem a ser chamadas de “atividades”. Na saúde pública, às vezes assumem a forma de “Programas”.

Exemplos:

  • Operações de atendimento a pacientes cirúrgicos em um hospital público.
  • Operações do programa de hipertensão de uma prefeitura municipal.
  • Operação de um laboratório de análises clínicas em um centro de diagnóstico.
  • Operação de uma central estadual de regulação de leitos.
  • Operações de uma seguradora de saúde no sudeste do país.
  • Operações de abastecimento de insumos hospitalares.

Operações pontuais

Muitas vezes estão associadas às “Campanhas” efetuadas pela Saúde Pública.

Exemplos:

  • Operações de uma campanha de vacinação.
  • Operações da campanha de conscientização para hanseníase.
  • Operações de atendimento médico da festa de réveillon na praia de Copacabana.

É preciso não esquecer que as operações podem e devem ser concebidas e organizadas de formas diferentes.

Operações de atendimento ambulatorial executadas em hospitais, Estratégia Saúde da Família ou em escolas têm clientelas, portes, motivações e requisitos de recursos e processos bastante diferentes para serem desenvolvidas. O mesmo vale para operações de atendimento cirúrgico quando realizadas em um grande hospital ou em uma unidade móvel rural.

Portanto, operações são sequências de processos previstas ou programadas para uma atividade, levam em conta o ambiente específico em que ocorrem, e consomem combinações variáveis de recursos para gerar produtos, dependendo do contexto.

Como há diferentes formas de organizar as operações, é muito difícil estabelecer parâmetros universais para os recursos necessários às operações dos serviços de saúde como, por exemplo, o número ideal de leitos para uma determinada população ou quantas ambulâncias um sistema de saúde deveria ter. Isso tudo depende da forma como cada um organiza suas operações...

Como uma organização tende a executar várias operações de portes diferentes, cabe selecionar as operações prioritárias e concentrar a atenção nelas para obter os maiores resultados no desempenho global.

Entretanto, sempre há uma considerável imbricação entre as várias operações da organização. Às vezes, um pequeno processo, comum a várias operações “prioritárias”, pode ser a chave para mudanças operacionais importantes.

Exemplo 1

Um hospital, cuja principal missão é realizar cirurgias, terá, com certeza, um ambulatório, um laboratório, um setor de nutrição, e muitos outros setores, todos realizando suas operações. Mas as operações e os principais processos do hospital serão aqueles vinculados à realização das cirurgias.

Exemplo 2

Melhorar o tempo de entrega dos resultados de exames de laboratório pode ter impactos importantes na operação de UTI, enfermarias, ambulatórios, e no centro cirúrgico.

Atividade de autoavaliação

Vamos fazer uma atividade de observação e análise.

Atividades semelhantes de atenção à saúde podem ser executadas mediante desenhos de operações distintos. Descreva dois desenhos possíveis para operações de dispensação de medicamentos a clientes ambulatoriais de serviços de saúde (esta é, provavelmente, uma das funções da atenção à saúde com a maior variação de desenho de operações).

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.

Comentários
A resposta foi salva em seu navegador com sucesso!
Não foi possível salvar o que escreveu. Copie, cole e salve seu texto de forma que possa consultá-lo posteriormente.
Desenho das operações de serviços

O ponto de partida para a definição das atividades e, consequentemente, das operações realizadas por uma organização de saúde, seja ela Secretaria Estadual de Saúde ou uma clínica privada, são as macrodiretrizes definidas no planejamento estratégico da organização ou nos planos de negócios das empresas, a partir de feedbacks epidemiológicos e/ou de mercado.

Uma vez que o planejamento estratégico defina:

  • o que será produzido,
  • em que quantidade,
  • e para qual clientela,

Podem ser desenhadas as operações para cumprir essas metas da forma mais “custo-efetiva” possível.

Vejamos o papel desempenhado, nesse processo, pelas gerências de operações e pelas gerências de recursos.

Gerências de operações

As gerências de operações são responsáveis pelo desenho, pela implantação e pelo acompanhamento das operações.

As questões básicas às quais as gerências de operações da organização precisam dar resposta são em que local, quando e de que maneira ofertar os produtos apontados pelo planejamento.

Em que local?

  • Qual a melhor localização ou disposição de locais para prestar o serviço?
  • Quais as características físicas dos ambientes necessários?

Quando?

  • No caso das operações pontuais, qual a duração da operação?
  • No caso das operações contínuas, quais os melhores horários para oferecer o serviço?

De que maneira?

  • Quais as sequências ideais e/ou mais viáveis para os processos de trabalho?
  • Que níveis de flexibilidade podem ter essas sequências?
  • Qual o procedimento ideal para gerenciar as filas?

Foto: Samuel Magalhães. Flickr.
Gerências de recursos

As questões básicas às quais as gerências de recursos precisam dar resposta são: que recursos (humanos, materiais, financeiros) são necessários para produzir esses produtos, e como mobilizar esses recursos?

Que recursos é preciso mobilizar?

Gerência de instalações
  • Qual o número de consultórios, salas, enfermarias ou similares, dependendo da operação?
Gerências de insumos
  • Que equipamentos e materiais precisam estar disponíveis?
  • Em quais locais e em que momento?
Gerências de recursos humanos
  • Qual a formação, competência e perfil dos profissionais necessários?
  • Quais os quantitativos necessários?
Gerência financeira
  • Como garantir o aporte dos recursos financeiros necessários e a programação de desembolsos prevista para a sustentação da operação pelo prazo programado?

Como os recursos serão mobilizados?

  • Que estratégias precisam ser utilizadas para a mobilização e deslocamento de recursos humanos, equipamentos e materiais?
Gerências assistenciais, de recursos e de operações

E, finalmente, a questão básica à qual as gerências assistenciais, de recursos e de operações precisam dar uma resposta conjunta é: esse é o melhor desenho para a operação?

Com as competências clínicas e os recursos disponíveis, o desenho proposto ou implantado é, de fato, o melhor para a operação?

  • A análise das competências clínicas e dos recursos previstos para cada conjunto de operações é uma atribuição conjunta das gerências assistenciais, de recursos e de operações.
  • O ideal é comparar custos, benefícios e a qualidade dos produtos de desenhos alternativos de operações propostos para atingir o objetivo pretendido.

A boa execução das operações de uma organização de saúde envolve o funcionamento integrado e eficiente, em seu conjunto, das várias gerências que controlam os recursos e operações das gerências assistenciais.

A competência de apenas uma ou duas das gerências de recursos e a boa organização interna de seus processos são insuficientes para garantir um bom resultado operacional global.

Todas precisam estar funcionando bem e de maneira muito articulada.

Atividade de autoavaliação

Vamos fazer uma atividade de observação e análise.

Com base nas perguntas do roteiro fornecido neste tema para desenhar operações, relacione as questões básicas de Planejamento Estratégico para uma Campanha de Vacinação contra a Poliomielite, na qual se espera que cerca de 15 mil crianças sejam vacinadas.

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.

Comentários
A resposta foi salva em seu navegador com sucesso!
Não foi possível salvar o que escreveu. Copie, cole e salve seu texto de forma que possa consultá-lo posteriormente.
Mapeamento de processos operacionais

Em qualquer operação, os processos de trabalho são executados em sequências que impõem a disponibilidade de:

  • recursos específicos
  • quantidades específicas
  • locais específicos
  • sequências temporais próprias de cada processo

O mapeamento dos processos é a viga mestra da gerência de operações. Basicamente, mostra “de que maneira” uma operação está sendo executada.

Para mapear processos, utilizam-se diversas ferramentas, como: Fluxograma (Figura 1), Diagramas em espinha de peixe (Figura 2) etc.

Figura 1 – Fluxograma
Figura 2 – Diagrama em espinha de peixe

Os fluxogramas para operações de serviço, em geral, mapeiam os processos-alvo identificando o fluxo de pessoas (clientes e profissionais), materiais, recursos financeiros e informações, gargalos e oportunidades de melhoria das várias etapas do processo.

Mesmo que não se domine ferramentas específicas, o simples exercício de relacionar e analisar as etapas de uma operação pode ajudar no raciocínio.

Vejamos, por exemplo, as operações de um laboratório de análises clínicas, com seus processos integrantes:

Fase pré-analítica

  • Recepção do cliente
  • Cadastro de dados do cliente e dos exames solicitados
  • Recebimento de amostras biológicas colhidas em outro local (inclusive em casa)
  • Coleta das amostras biológicas (sangue e outras)
  • Serviço de atendimento a médicos solicitantes de exames

Fase analítica

  • Conferência e verificação da adequação das amostras de material biológico
  • Distribuição das amostras entre os setores responsáveis por cada tipo de exame (hematologia, bioquímica, imunologia, parasitologia etc.)
  • Processamento das amostras pelos setores
  • Emissão dos resultados pelos setores
  • Confirmação dos resultados pelo responsável
  • Encaminhamento dos resultados ao setor de atendimento ao cliente

Fase pós-analítica

  • Entrega de resultados ao cliente
  • Serviço de atendimento a médicos solicitantes de exames

Cada uma dessas etapas (ou processos) merece uma reflexão crítica sobre como está sendo ou irá ser desenvolvida.

Operações, portanto, têm vários níveis de detalhamento, desde os níveis macro em que são relacionados e definidos os recursos físicos que elas demandam, até os níveis micro, que mobilizam fundamentalmente conhecimentos sobre como se desenvolvem os processos operacionais, e uma reflexão sobre como poderiam funcionar melhor.

No mapeamento de processos operacionais, cada processo precisa ser alvo de uma reflexão crítica e criativa, principalmente se ele estiver sendo a fonte de falhas de operação.

Mesmo alterações no nível micro, que não implicam agregar novos recursos, podem ter um enorme impacto.

Veja o seguinte exemplo:

O sistema de fila única

O sistema de atendimento em fila única, inicialmente desenvolvido pelos bancos, é uma “operação de atendimento ao cliente” que foi um verdadeiro “ovo de Colombo”, e envolveu apenas um redesenho do fluxo de atendimento da clientela.

Antigamente, você entrava numa agência bancária e escolhia um guichê para ser atendido, dentre os tantos disponíveis. Lembra-se como era desagradável descobrir que alguém que chegou meia hora depois de você, mas escolheu uma fila que andou mais rápido e já foi atendido, enquanto você continuava “mofando” na fila do seu guichê?

Em operações de serviços, os “detalhes” tendem a ser essenciais.

Participação das equipes

Mais importante do que a existência formalizada de gerências de operações (o que pode corresponder apenas a “criar mais uma caixinha” no organograma com a função de pensar e redesenhar isoladamente as operações) é a incorporação de uma mentalidade de operações pelas gerências assistenciais e administrativas, que viabilize um trabalho conjunto com foco nos processos produtivos.

Decisões sobre operações, principalmente quando se tratar de uma situação de falha ou redesenho operacional, precisam ser discutidas coletivamente, com o máximo de participantes do processo operacional ou, no mínimo, com componentes críticos ou estratégicos desse processo.

É fundamental a participação das equipes no desenho e acompanhamento das operações. Além disso, é um erro redesenhar operações já implantadas sem consultar quem as executa.

Sem a participação da equipe, perde-se a oportunidade de conhecer melhor as condições e os detalhes das operações e de identificar pontos frágeis da operação, que precisam ser repensados e pontos fortes, que já estão implantados e podem ser reforçados.

Mudar processos operacionais já implantados é mudar rotinas, hábitos das pessoas.

Em alguns casos, são mudanças tão difíceis como reaprender a andar.

É pouco realista imaginar que basta elaborar um protocolo e divulgá-lo, carimbando-o com um “cumpra-se” e tudo se resolverá. As pessoas que participam das operações precisam ser constantemente motivadas a participar e a se considerarem “donas do processo”, para que se fomente uma “cultura organizacional” de atenção aos processos operacionais.

Atividade de autoavaliação

Vamos fazer mais uma atividade de aplicação prática.

Descreva as atividades de um serviço de nutrição hospitalar e identifique os processos componentes. Comece a descrição pela visita da nutricionista ao cliente internado e termine com a entrega da refeição no quarto.

Digite suas ideias no espaço a seguir e, quando terminar, clique no botão Salvar. Depois, veja se você considerou, em sua resposta, os pontos destacados nos comentários.

Comentários
A resposta foi salva em seu navegador com sucesso!
Não foi possível salvar o que escreveu. Copie, cole e salve seu texto de forma que possa consultá-lo posteriormente.

Encerramos aqui o estudo deste tema. Agora, você pode avançar para o Tema 1.5. Gerenciamento da capacidade instalada.

Tema 1.5Gerenciamento da capacidade instalada

Gerências de Operações trabalham para fazer com que a organização inteira funcione como um “sistema produtivo”, onde as atividades estão explicitamente inter-relacionadas, e são responsáveis:

  • pelo desenho e acompanhamento dos processos operacionais;
  • pela qualidade do produto organizacional (no caso, dos serviços de saúde prestados); e
  • pelo gerenciamento da capacidade instalada.

Vamos discutir mais a fundo, neste tema, o gerenciamento da capacidade instalada.

É muito comum vermos hospitais descrevendo sua capacidade instalada como o número dos diversos tipos de leito de que dispõe.

Rede SARAH

O SARAH, de Brasília, refere uma capacidade instalada de 427 leitos em sua home page (fev. 2019):

  • 96 leitos unidades críticas
  • 331 leitos unidades não críticas

Hospital Dr. José Frota

O Hospital Dr. José Frota, de Fortaleza/CE, possui a seguinte capacidade instalada (2018):

  • leitos da internação: 425

Entretanto, a capacidade instalada corresponde, na verdade, a todo o potencial de produção de determinada organização, levando-se em conta suas instalações físicas e equipamentos.

Isto quer dizer que abrange todos os recursos fixos da organização destinados a viabilizar a produção (e, por isso, não inclui recursos humanos e estoques de materiais).

Portanto, importa conhecer não apenas leitos, mas salas de cirurgias, consultórios e equipamentos de todos os tipos.

Um gerenciamento adequado da capacidade instalada, em uma organização prestadora de serviços de saúde, pressupõe compatibilidade ideal entre recursos humanos, estoques de materiais e capacidade instalada, conforme mostram a figura e o quadro abaixo:

Compatibilidade entre: Com um mínimo de:
  • recursos humanos;
  • estoques de materiais;
  • capacidade instalada.
  • folga operacional (ociosidade); e
  • gargalos: interrupções das operações habituais causadas por problemas no desenho das operações, ou problemas na alocação dos vários recursos necessários à execução da operação.

O gerenciamento da capacidade instalada de uma organização é uma das muitas atribuições conjuntas das gerências de recursos e das gerências de operações.

Abaixo, listamos alguns exemplos de problemas de gerenciamento de capacidade muito comuns nas organizações de saúde. Clique em cada item para saber mais:

Uso irracional de espaços físicos

A manutenção de qualquer espaço ou instalação tem um custo fixo significativo, ainda que o mesmo não seja utilizado. São despesas com segurança, limpeza, manutenção, luz, gás, entre outras, que buscam evitar que o patrimônio se deteriore.

É enorme o número de instalações de saúde subutilizadas ou, mesmo, abandonadas, principalmente no sistema público de saúde.

Hospitais inteiros são construídos sem se pensar que, como regra geral, o custo de construção equivale ao custeio anual de operação de um hospital. Ou seja, manter em funcionamento um hospital construído a um custo de 10 milhões de reais implica, em geral, desembolsar uma quantia bem próxima de 10 milhões de reais a título de custeio anual para o funcionamento do mesmo.

Cada vez mais, portanto, a tendência é racionalizar o uso de instalações físicas e dos tempos de ocupação desses espaços nas ações de saúde, com o recurso a estratégias como hospital-dia, atenção domiciliar e cirurgia ambulatorial.

Desequilíbrios quantitativos

Desequilíbrios quantitativos entre os diversos profissionais, equipamentos e materiais.

Suponhamos o caso de uma clínica em Sorocaba-SP, por exemplo, que tenha um equipamento de ultrassom que poderia funcionar 12 horas por dia.

Apesar de haver uma demanda reprimida que poderia justificar a oferta do exame por mais um turno de quatro horas, funciona apenas quatro horas, porque só foi contratado um profissional com carga horária de quatro horas diárias.

Podemos dizer que há uma possível folga operacional em termos de equipamento, e um gargalo ocasionado por uma insuficiência de profissionais habilitados para operá-lo.

Alocação de recursos com base em prestígio profissional

É o caso de leitos distribuídos entre departamentos e serviços de especialidade em função do “prestígio” do chefe de serviço, e não de acordo com a demanda dos pacientes. Assim, por exemplo, os leitos da enfermaria de oftalmologia podem ter baixíssimas taxas de ocupação, com vários leitos desocupados, enquanto faltam leitos de internação na cardiologia.

Portanto, temos uma folga operacional na oftalmologia, que contrasta com o gargalo da clínica médica.

Problemas de ociosidade

Um exemplo seria a ociosidade do centro cirúrgico em detrimento de longas filas de espera para cirurgias (gargalo). O caso da cirurgia cancelada, que vimos em tema anterior, é um exemplo clássico.

A ociosidade das salas de cirurgia pode ser provocada por:

  • desequilíbrios entre o número de cirurgiões, anestesistas e auxiliares de enfermagem para atuar no centro cirúrgico;
  • falta de materiais para realizar a cirurgia;
  • falta de agilidade na limpeza das salas ou na disponibilidade de roupas esterilizadas;
  • falta de contato com o hemocentro para providenciar a reserva de sangue necessária a um procedimento cirúrgico específico;
  • ...e diversos outros motivos.

Com isso, deixa-se de fazer bom uso de um recurso essencial.

O gerenciamento da capacidade instalada compreende não apenas a compatibilidade dos recursos entre si e destes com a demanda, mas, também, definições sobre operações realizadas na própria organização ou fora dela (terceirizadas), e um gerenciamento adequado das filas.

Atividade de autoavaliação

Vamos encerrar o estudo deste tema com uma atividade de análise.

Associe os problemas de gerenciamento de capacidade com as imagens ao lado. Clique na descrição do problema e, em seguida, escolha a imagem que corresponde a ele. Caso sua seleção não esteja correta, um X indicará que a opção não é válida e você tem a chance de tentar novamente, até fazer acertar a correspondência dos pares.

Limpar seleção

Com isso encerramos o estudo deste tema. Agora, você pode avançar para o Tema 1.6. Gerenciamento de filas e esperas.

Tema 1.6Gerenciamento de filas e esperas

O gerenciamento das filas é, sem dúvida, um dos maiores desafios enfrentados por sistemas de saúde, principalmente os públicos.

As filas vêm sendo motivo de duras críticas da população inglesa a seu tradicional sistema de saúde e, no Brasil, a situação é ainda pior, pois, em geral, nem sabemos o tamanho de nossas filas.

Filas são um motivo universal de queixa e insatisfação.

Em uma pesquisa realizada no Brasil, pelo Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde, em 2002, os três principais problemas do SUS apontados pela população foram:

Tabela 1 – Principais problemas do SUS
Filas de espera para obter consultas 41,3%
Filas de espera para exames 14,4%
Filas de espera para internações 7,3%

Temos aí a medida da importância do problema.

Vejamos, agora, como algumas ideias da engenharia de produção podem ajudar a melhorar o gerenciamento das filas.

O caso do centro cirúrgico, discutido no Tema 1.4, desta unidade, ilustra um problema de gerenciamento de fila. O problema é acarretado pelo fato de o cliente ter que aguardar um tempo muito acima do necessário ou ideal para chegar à sala de cirurgia, ou seja, por uma falha nas operações do atendimento cirúrgico. Em função dessa falha, toda a “fila” de cirurgias ficou prejudicada, andando mais devagar do que deveria, e a capacidade instalada ficou temporariamente ociosa.

Em situações de recursos escassos, a atenção ao gerenciamento das filas torna-se ainda mais fundamental.

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil. Flickr.

Assim, é importante propor estratégias para organizar os fluxos da clientela, otimizando o “processamento” das filas.

Um gerenciamento eficiente de filas no setor de saúde é um poderoso instrumento de garantia de continuidade do cuidado, pois ajuda a racionalizar fluxos e encaminhamentos ao longo de todo o sistema de saúde, diminuindo os fenômenos da " porta rotatória e a ociosidade da capacidade instalada.

O gerenciamento das filas tem por objetivo a otimização do uso da capacidade instalada através da ordenação racional e eficiente do acesso do cliente que irá “disparar” a operação de serviço.

No Brasil, entre as operações organizadas e estruturadas para permitir o adequado gerenciamento das filas estão incluídas muitas das chamadas “experiências inovadoras do SUS”, entre elas as operações:

As experiências de porta de entrada e de saída foram, em sua maioria, englobadas nos projetos mais amplos de Humanização do atendimento, que têm como um de seus objetivos reduzir as filas e o tempo de espera, com ampliação do acesso e atendimento acolhedor e resolutivo, baseado em critérios de risco.

Os gestores do SUS vêm estimulando intensamente projetos de Humanização do atendimento, na rede pública, nos últimos anos.

Se você pesquisar na internet (ou em outros veículos de comunicação) informações sobre essas iniciativas, perceberá que todas elas são iniciativas de organização dos fluxos da clientela (ou seja, de gerenciamento de filas, na linguagem de operações de serviços), que pressupõem alguma ou todas as etapas indicadas abaixo.

Definição de prioridades de atendimento – estabelecer essas prioridades e detectá-las nas filas é uma necessidade evidente nas emergências, por exemplo.

Desenho de operações de marcação de consultas, cirurgias e outros procedimentos para evitar congestionamentos de pacientes – sistemas de consulta com hora marcada, organização do atendimento por senhas, entre outros.

Definição de fluxos de encaminhamento internos e externos, este último abrangendo a definição de sistemas de referências e contrarreferências.

Operações de gerenciamento de esperas.

A base para a necessidade de operações de gerenciamento de filas é o fato de a demanda por serviços de saúde não ser uniforme e, muitas vezes, ser superior à oferta na área de saúde.

Com isso, surge a necessidade de:

  • antecipar o padrão de demanda;
  • desenvolver ações para tornar as demandas mais uniformes;
  • desenvolver ações para tornar as operações mais flexíveis, permitindo aumentar ou reduzir a capacidade de operação com rapidez (políticas para pico de demanda, como equipes de reserva ou de sobreaviso, e referências externas para as unidades de apoio);
  • realizar triagem (inclusive para definição de prioridades de atendimento) e encaminhamento adequado dos clientes ao longo dos fluxos de atendimento;
  • organizar filas de espera.

Vamos ver um exemplo de fora da área de saúde.

O Metrô do Rio e o show dos Rolling Stones

As operações de gerenciamento de filas desenhadas pelo Metrô do Rio de Janeiro para o show dos Rolling Stones, em fevereiro de 2006, são um exemplo interessante. O show foi programado para as 22 horas de um sábado, e o acesso a Copacabana para automóveis foi fechado a partir das 18 horas. Com isso, o metrô transformou-se na principal opção de acesso ao local. A expectativa, posteriormente confirmada, era de que mais de um milhão de pessoas fossem assistir à apresentação.

O metrô, habitualmente, não trabalha com “agendamento” de horários.

No entanto, antecipando um padrão de demanda onde sua capacidade instalada poderia ser insuficiente caso a demanda não fosse dividida em vários horários, com um consequente congestionamento de passageiros, a administração do Metrô decidiu desenvolver ações para tornar a demanda mais uniforme. Para uniformizar o fluxo de passageiros, os tíquetes para viagem, na noite do show, só eram vendidos antecipadamente, divididos em seis faixas de horário (18-19h, 19-20h, 20- 21h, 21- 22h, 22-23h e 23-24h).

Na verdade esse foi um engenhoso mecanismo de “agendamento” de horários de viagem. O sucesso dessa estratégia de operação fez com que, a partir daí, ela fosse adotada em todos os grandes eventos realizados na cidade, como carnaval, réveillons e até na visita do Papa Francisco em 2013.

Para refletir

Pense no seguinte:

Você consegue imaginar alguma situação em serviços de saúde, na qual uma estratégia semelhante à adotada pelo Metrô do Rio poderia ser adequada?

O que você acha? Pense um pouco nisso antes de prosseguir. Recomendamos que você registre as suas ideias a esse respeito e salve de uma maneira que possa consultá-las posteriormente.

Quando terminar, volte a esta página e continue seu estudo.

Um outro exemplo bastante interessante e criativo de gerenciamento de filas é o das filas para doação de sangue, que se encontra relatado a seguir, no exemplo “Gerenciamento de filas no Hemorio”.

No gerenciamento desse tipo de fila, reduzir os tempos de espera pode ser ainda mais fundamental do que no caso da marcação de uma consulta ou exame de rotina.

As organizações de saúde precisam dos doadores, que voluntariamente disponibilizam seu tempo para realizar uma ação de solidariedade. Neste caso, a disposição do doador para esperar pode ser menor do que a de um cliente que deseja marcar uma consulta.

Portanto, as estratégias de gerenciamento das filas também precisam considerar as características da clientela, em aspectos que vão da gravidade da doença à disposição para esperar.

Foto: Clarice Castro. Flickr.

Estratégia de gerenciamento de filas no Hemorio-RJ

O Hemorio é o centro responsável pela coleta da maior parte do sangue utilizado em hemotransfusões realizadas na rede pública da cidade do Rio de Janeiro, além de coordenar toda a hemorrede do estado.

Há alguns anos, a coleta do Hemorio funcionava apenas de segunda a sexta em horário comercial. Observava-se que o afluxo de doadores no turno da manhã era excessivo e à tarde, bastante reduzido, ou seja, havia picos impressionantes de atendimento de doadores pela manhã, e uma grande ociosidade da capacidade instalada de coleta à tarde. Mesmo o reforço da equipe no turno da manhã, na tentativa de reduzir o gargalo no atendimento dos doadores, teve pouco impacto.

Descobriu-se, então, que a maioria dos doadores achava que precisava estar em jejum para doar sangue, crença derivada do jejum necessário para realizar exames de sangue, e que vários deles prefeririam doar sangue no final de semana, para não terem que faltar ao trabalho. Todos chegavam cedo para tentar ser atendidos logo.

As estratégias adotadas para gerenciar a fila, no caso, foram a criação de horários de doação de sangue nos finais de semana e a inclusão, em todas as campanhas de doação, de um aviso de que, para doar sangue, a pessoa não precisa estar em jejum.

O gerenciamento das filas comporta operações fortemente calcadas na comunicação, seja com o cliente, para organizar os fluxos da clientela dentro da organização, ou entre as várias organizações componentes da rede de serviços de saúde, para viabilizar uma boa dinâmica de referências e contrarreferências.

Além disso, envolve também operações de gerenciamento das esperas pois, quando a demanda não é uniforme ou a capacidade instalada é insuficiente, há períodos em que a formação de filas pode ser quase inevitável.

No gerenciamento das esperas, precisam ser tomadas medidas para identificar clientes com quadros agudos e potencialmente urgentes, que terão prioridade no atendimento, além de medidas que visem transformar a espera em algo menos desagradável ou até útil para o cliente.

Nesse sentido, é necessário dar atenção ao ambiente de atendimento, que deve ser o mais confortável e tranquilizador possível. Televisões com volume baixo ou desligado nas salas de espera são um recurso muito usado. Uma alternativa, por exemplo, é programar atividades de educação em saúde para esses períodos de espera, utilizando-se de forma positiva esse tempo em atividades de promoção da saúde.

Com a ajuda das gerências assistenciais, o gerenciamento das filas pode ganhar muito em qualidade.

Também é importante desenvolver operações de gerenciamento para filas de espera “virtuais” que se formam fora das organizações de saúde, como, por exemplo, filas de cirurgias, de transplantes ou de qualquer outro tipo de atendimento escasso.

Nesses casos, a transparência dos critérios de risco que justifiquem considerar um paciente como credenciado a atendimento prioritário, e a clareza das informações sobre o andamento da fila, costumam ser as melhores soluções.

Ambas, “virtuais” e “físicas”, se apoiam em operações de comunicação com o cliente.

Veja, abaixo, dados sobre a espera para transplantes de órgãos no Brasil:

Figura 1 – Transplante de orgãos: 32.402 pacientes em lista de espera no Brasil (dezembro 2017)
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2017).
Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos Transplantes no Brasil e em cada estado (2010-2017). Registro Brasileiro de Transplantes Veículo Oficial da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos - Ano XXIII Nº 4. 2017.
Tabela 2 – Necessidade anual estimada e nº de transplantes no Brasil (2017)
Córnea Rim Fígado Coração Pulmão
Necessidade estimada 18.547 12.365 5.152 1.649 1.649
Transplantes realizados 15.212 5.929 2.109 380 112
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2017).
Figura 2 – Crescimento do número de doadores efetivos no Brasil (2010 a 2017)
Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2017).

Os setores habitualmente encarregados das operações de gerenciamento de filas incluem:

Centrais de marcação de consultas e exames

Setores de recepção e informações

Centrais de regulação de leitos ou vagas

Um problema clássico de gerenciamento das filas e de muito impacto quando os recursos são escassos, como na saúde, são os “furos” de “agendamento”, para os quais é preciso elaborar estratégias.

O fato de deixar de utilizar a capacidade instalada implica desperdício de recursos caros, que ficarão ociosos, e esperas desnecessárias por parte dos clientes.

Veja, a seguir, um exemplo da dimensão que esse problema pode tomar em um sistema de saúde.

Filas de espera em Bauru-SP

A lista de espera por atendimento médico, em Bauru, tem 20.178 mil nomes. A fila por ortopedia, por exemplo, não anda praticamente há seis meses. Um único especialista da área atende a todos os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) de Bauru, no Ambulatório de Especialidades da Direção Regional de Saúde (DIR-10). Se ele entrasse em férias hoje, os 16 atendimentos diários seriam interrompidos.

Ao todo, 20% dos pacientes faltam à consulta marcada com os especialistas. O percentual chamou a atenção do promotor de Justiça, Cidadania e Defesa do Patrimônio Público, para quem uma campanha deve diminuir o índice de ausentes.

“A gente faz um apelo à população: que não falte ou ligue para avisar a falta. A pessoa não vai e depois volta para a fila”, explica. O promotor compreende as dificuldades a que estão submetidos os usuários, como, por exemplo, falta de recursos até para pegar um ônibus, mas reitera a necessidade de se comunicar a ausência. Ele também aproveitou o encontro de ontem para reivindicar que, no imóvel onde será instalada a Central de Vagas (órgão que concentrará a demanda por consultas especializadas e encaminhará os casos conforme a oferta e a gravidade do paciente), os usuários recebam atendimento adequado, enquanto o cartão do SUS é confeccionado.

Fonte: Adaptado de Luciana La Fortezza, Jornal da Cidade de Bauru (2006).

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil. Flickr.
Leitura complementar

Praticamente não há literatura nacional sobre operações em serviços de saúde, na forma discutida neste módulo.

Entretanto, muitos conceitos e ferramentas da Gestão da Qualidade Total podem ajudar a avançar nesse caminho. Sugerimos o livro de Roberto Passos Nogueira, Perspectivas da Qualidade em Saúde, da Qualitymark Editora, Rio de Janeiro, 1994.

Para refletir mais um pouco sobre a dicotomia entre gerências assistenciais e administrativas, vale a pena ler também os artigos de Luís Carlos de Oliveira Cecílio, em especial A modernização gerencial dos hospitais públicos: o difícil exercício da mudança (1997), na Revista de Administração Pública 31(3): 36-47.

Se você quiser saber um pouco mais sobre o problema das filas, leia o texto elaborado por Alexandre Marinho, do IPEA: Um estudo sobre filas para internações e para transplantes no Sistema Único de Saúde brasileiro.

Agora, faça a atividade de envio que está disponível no ambiente virtual de aprendizagem, conforme o cronograma.