Tópicos Módulo 7

Introdução

Este é o Módulo 7, o último! Representa o fim do nosso curso, mas o início de um novo fazer.

Após estudarmos as questões políticas e técnicas que estão por trás de um ato transfusional, podemos nos fazer a seguinte pergunta: como organizar todos esses requisitos e procedimentos para que o ato ocorra da forma mais segura possível para todos os envolvidos: pacientes, doadores e profissionais de saúde?

Os serviços de hemoterapia, independentemente de sua complexidade, devem disponibilizar produtos e serviços com qualidade e eficácia que atendam às necessidades de seus pacientes. E, na posição de responsáveis técnicos (RT), nós somos diretamente responsáveis por isso.

Diante desse desafio, estudaremos neste módulo a implantação de práticas de gestão da qualidade e conheceremos os principais mecanismos de regulação e avaliação, além de algumas ferramentas de melhoria contínua. Realizaremos esse estudo por meio da análise de um caso.

Vamos em frente?

Imagem extraída do vídeo produzido pela Asfoc/Fiocruz (2017).

Estudo de caso

Hoje vamos acompanhar alguns dias do trabalho de Josué Rh Neg Lemos, no Hospital e Pronto-Socorro Vida, em que ele é RT da AT.

Hospital e
Pronto-Socorro Vida

  • Unidade privada contratada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), responsável pelo atendimento das transfusões hospitalares.
  • Fluxo médio de 400 transfusões/mês.

Os dias não têm sido dos melhores na vida profissional de Josué...

Em uma quarta-feira e como sempre, de surpresa, ele resolveu reunir o grupo para tratar das questões internas.

Equipe de Trabalho

  • Um gerente da agência.
  • Oito funcionários.

Na última reunião, ocorreu um tenso debate sobre a falta de sangue.

Como o controle de estoque não é bem conhecido pelo gestor, o grupo é sempre colhido de surpresa quando a situação chega a níveis críticos.

Nessa reunião, Marcelo, o gerente, apontou a necessidade de definição e implantação de um controle mais efetivo de liberação, descarte e devolução das bolsas de sangue.

Josué contemporizou dizendo que, apesar de o hospital possuir um serviço de Ouvidoria, as sugestões e reclamações nem sempre chegam ao conhecimento dos responsáveis pela AT.

A enfermeira Jussara contrapôs...

Disse que chegam algumas reclamações devido:

Acrescentou que o tema já foi debatido em uma das reuniões do grupo, mas infelizmente ninguém fez um registro formal dos encaminhamentos.

O clima ficou pesado, mas Josué colocou “panos quentes”; e todos concluíram que os responsáveis pelas áreas do hospital e os pacientes são, às vezes, muito exigentes e por isso agem assim. Além disso, quanto mais se fizer por eles mais eles pedirão, não tendo fim as exigências, disse o técnico Josias.

Gerente da AT, Marcelo discordou e disse que há falta de pessoal, que o quadro é limitado e acrescentou, ainda, as limitações de infraestrutura da agência. Disse finalmente que por inúmeras vezes há quebra de equipamentos e demora no reparo, não existindo reservas para momentos críticos.

E nessa reunião de hoje, o que vai acontecer? Vamos ver?

Começou com uma surpresa.

Josué: Percebi que não temos uma rotina de limpeza e coleta de resíduos. Isso é importantíssimo para a segurança no ambiente de trabalho....

Depois da reunião, Josué permaneceu um pouco mais no setor e observou algumas questões importantes. Leia as anotações dele.

Pontos críticos:

  • A equipe utiliza as mesmas luvas descartáveis durante todo o período de trabalho, sem troca.
  • Os profissionais foram treinados na admissão, mas não sabiam da existência de procedimentos operacionais sobre uso de luvas e orientações de biossegurança.
  • Não há registro de limpeza.
  • Acúmulo de sujeira em alguns cantos, embaixo de móveis e de alguns equipamentos.
  • Somente uma lixeira na área destinada ao descarte de todos os resíduos, identificada como lixeira para resíduo biológico (infectante). Lá são descartados desde um papel de rascunho até as unidades de hemocomponentes rejeitadas por validade.
  • Há controle das unidades descartadas.
Prancheta

Na última semana, Josué resolveu sair da rotina e verificar como estavam as coisas em algumas áreas do hospital.

Conversou com plantonistas do período diurno e do noturno e também de algumas áreas de assistência do hospital. Durante o dia, pôde verificar as condições dos registros nos prontuários e, para sua satisfação, constatou organização e arquivo adequado.

Contudo, ao conversar com as Comissões de Biossegurança e de Gerenciamento de Resíduos, constatou que não havia na AT uma pessoa que se envolvesse com esses assuntos e que não participavam de reuniões e treinamentos.

As semanas passaram, e em uma segunda-feira de manhã…

Josué: Bom dia, Jussara e Josias. Vocês queriam falar comigo?

Jussara: Bom dia, Dr. Josué. Queremos, sim. Nosso estoque não está muito bom, temos poucas unidades disponíveis, a maioria de A(+) positivo. Sabe, as coisas andam muito desorganizadas por aqui. Na semana passada, um lote de plaquetas foi desprezado por ter sido solicitado em quantidade além da normal.

Josias: Sem falar que daqui a pouco vamos perder reagentes e hemocomponentes porque está muito difícil controlar a temperatura dos refrigeradores. Ah! Ainda tem alguns reagentes de provas faltando. Enfim, tem muita coisa para o senhor resolver...

A fim de resolver a questão de fornecimento, Josué decide convocar uma reunião extraordinária, devido aos problemas de controle de estoque e falta de reagentes.

Rose: Sei que sou a responsável pelas solicitações de materiais, mas o problema está na liberação morosa do serviço fornecedor, por isso tem atraso!

Marcelo: Sobre os reagentes, o almoxarifado do hospital é burocrático demais! Às vezes alguns chegam aqui com prazo de validade muito curto... já tivemos que utilizar reagente vencido para liberar sangue para transfusão. É complicado!

Depois de alguns desabafos, uma fala de Marcelo provoca tulmuto.

Marcelo: Pessoal, na minha opinião, nosso maior problema é a falta de um programa de qualidade para todos. Sei que essa palavra causa calafrios. Também lembro que já vivenciamos uma experiência aqui, e os resultados foram pífios. Sobraram apenas os POP e o uso de algumas ferramentas...

Jussara: A gente poderia tentar novamente, fiz um curso em que discutimos a Portaria Ministerial n. 158, de 4 de fevereiro de 2016, e um dos parágrafos citava a necessidade de implementar a melhoria contínua etc.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 158, de 4 de fevereiro de 2016. Redefine o regulamento técnico de procedimentos hemoterápicos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 fev. 2016. Seção 1, p. 37. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=37&data=05/02/2016>. Acesso em: 5 mar. 2016.

Sistema da qualidade e gestão de risco

Você também sente calafrios ao ouvir falar em Programa da Qualidade?

Lembre-se de que a implantação do sistema de gestão da qualidade visa à padronização e à realização de todas as atividades sob condições controladas. Seus pilares de sustentação estão representados na imagem a seguir e basta um clique para saber mais sobre cada um deles.

Esta foi apenas uma visão geral sobre os pilares da qualidade.

Aprofunde seus conhecimentos sobre o sistema de gestão da qualidade lendo o material complementar que os autores do módulo escreveram especialmente para este curso.

Princípios gerais do sistema da qualidade e gestão de risco em agências transfusionais .

Considerando os aspectos abordados no sistema de gestão da qualidade e o processo de avaliação das AT, reflita sobre os pontos de maior dificuldade para o cumprimento das normativas da área.

De volta à reunião..

A confusão estava grande! Cada um culpando alguém por ser responsável pelos problemas de todos.

Mal eles sabiam que recentemente uma unidade de concentrado de hemácias (CH) A+ foi equivocadamente liberada para transfusão em paciente O+. O funcionário que instalou a bolsa identificou a falha logo nos primeiros minutos em que permaneceu à beira do leito, retirando rapidamente o CH.

Embora o paciente tenha apresentado reação, os danos foram menores, uma vez que os funcionários agiram com rapidez e comunicaram ao médico assistente, que deu os devidos encaminhamentos.

Vigilância sanitária

Após a reunião, Josué chama Marcelo para uma conversa particular.

Josué: Não paro de pensar na troca das bolsas. O desfecho poderia ter sido muito pior!

Marcelo: Verdade! Talvez o pessoal da vigilância sanitária possa nos ajudar a melhorar esse controle...

Lembro que eles nos ajudaram muito no processo de aquisição da licença sanitária da nossa AT.

Para a licença inicial, concedida antes do início das atividades, eles pediram documentos como:

  • identificação jurídica do estabelecimento;
  • responsabilidade técnica;
  • contratualização de fornecedores de hemocomponentes;
  • aprovação de planta baixa (projeto arquitetônico);
  • outros requisitos específicos das legislações e dos códigos sanitários locais.

Após a avaliação documental, os inspetores da Visa realizarão avaliações in loco no estabelecimento a fim de comprovar as adequações aos requisitos da legislação referentes à qualidade e segurança de processos e produtos.

É muito importante que você conheça as regras para o licenciamento e a regularização junto à Vigilância Sanitária (Visa) competente onde está localizada a AT. Além disso, não esqueça que a licença deve ser renovada anualmente!

Josué: Por falar em Visa, Marcelo, eu sempre lembro da primeira inspeção por que passei aqui... Que sufoco! Os inspetores pediram para olhar todo o espaço e nossos equipamentos; entrevistaram os técnicos e a gente; pediram para analisar todos os nossos documentos e registros.

Josué: E ainda teve uma outra vez em que eles fizeram uma inspeção guiada desde a coleta da amostra até a transfusão! Mas hoje estou bem mais seguro...

Conheça o roteiro de inspeção sanitária que será aplicado como instrumento avaliativo de sua AT. Nele é possível verificar quais itens de controle serão exigidos pela Visa. Trata-se de documento de acesso público!
O roteiro de inspeção em sangue padrão no Brasil é o publicado pela RDC n. 34/2014 (BRASIL, 2014), que é composto por cinco módulos de acordo com os setores do ciclo do sangue. Para inspeção numa AT, utilizam-se o Módulo 1 e o Módulo 5.

Josué: A conversa está muito boa, mas tenho que ir. Preciso notificar aquela reação do paciente do leito 3 ainda hoje no Notivisa...

O olhar de vigilância sanitária deve estar sempre inserido nas ações de todos os profissionais da AT, principalmente nas suas, o RT. Dessa forma, ao avaliar constantemente os riscos de práticas e produtos no serviço, estamos sempre aprimorando as condutas referentes à segurança dos pacientes.

Continue seus estudos sobre a vigilância sanitária nas AT, os processos de inspeção, licenciamento e notificação fazendo o download do material complementar.

Vigilância sanitária em agências transfusionais

Estudo de caso

Como a última reunião havia sido um desastre, Josué resolveu convocar uma outra.

Com o passar dos dias, os ânimos foram se acalmando, e a equipe conseguiu encontrar um caminho para o entendimento.

Diante de tantos problemas, começaram a procurar por alguma ferramenta que pudesse auxiliá-los...

Programa Nacional de Qualificação da Hemorrede (PNQH)

Tomando nota de nossas ações e dos próximos passos, lembrei do PNQH. Será que conseguimos alguma ajuda?

Silueta margem-topo4

Você quer saber como o PNQH poderia fomentar a melhoria técnica e a gerencial na AT?

Para mais detalhes sobre o programa, leia o material complementar disponibilizado aqui.

Guia para implementar avaliações nos serviços de hematologia e hemoterapia na perspectiva do Programa Nacional de Qualificação da Hemorrede

Ao conhecer e estudar o programa, a equipe iniciou o trabalho com a identificação dos pontos críticos da AT, uma vez que é essencial que o serviço busque assegurar a disponibilização de hemocomponentes na quantidade e na hora certa para prestação de serviços com qualidade.

Primeiro, foi desenhado um macroprocesso e, depois, analisadas as atividades-chave. Veja.

Saiba mais sobre o método de avaliação e a evolução do PNQH neste texto. Boa leitura!

O Programa Nacional de Qualificação da Hemorrede: modelo de avaliação de serviço e ferramenta de melhoria

Estudo de caso

Por fim, a equipe chegou à conclusão de que a melhor saída era trabalhar em sinergia e, assim, resolveu formar uma força-tarefa.

Para isso:

  1. listaram os problemas;
  2. marcaram prazos para uma resposta;
  3. definiram os responsáveis por cada um dos problemas;
  4. desenharam um macroprocesso para que todos pudessem conhecer todos os processos e as responsabilidades de cada um, bem como a necessidade de registro e tratamento das não conformidades.

Após todo esse trabalho, a equipe sentiu a necessidade de implantar um sistema de gestão da qualidade na AT. Além disso, resolveu incentivar a criação de um comitê transfusional, inexistente até o momento, visando ao aperfeiçoamento da segurança transfusional.

O hospital em que você trabalha tem um sistema de gestão da qualidade?

Observação: ao implementar um sistema de gestão da qualidade, lembre-se da importância de alinhamento do sistema da AT com o do hospital.

Considerações finais

O monitoramento e as avaliações interna e externa dos processos de trabalho de uma AT, além da previsão legal, visam a possibilitar que o usuário dos serviços de saúde tenha acesso à atenção hemoterápica de forma segura e com qualidade, de acordo com os princípios do SUS. Nessa perspectiva, este módulo apresentou ferramentas que você, na função de RT de uma AT, poderá aplicar em sua instituição para atender aos requisitos legais e de boas práticas.

Independentemente do instrumento metodológico, seja por meio dos mecanismos regulatórios sanitários, pela prática do PNQH, por entidades certificadoras, ou até mesmo apenas pela autoavaliação, este módulo afirma a importância de que práticas avaliativas sejam institucionalizadas, com vistas à orientação de uma gestão estratégica voltada para a premissa da qualidade.

Atividade 8

1

Período de realização

Atividade individual

Fórum de discussão

Para avaliação da Unidade de Aprendizagem III, Qualidade e risco, você deverá identificar duas não conformidades no Estudo de caso – AT do Hospital e Pronto-Socorro Vida e elaborar um plano de ação para resolução dessas duas não conformidades.

Duas observações importantes:

Formulário modelo de plano de ação de melhorias do Programa Nacional de Qualificação da Hemorrede

Para mais informações sobre ferramentas de avaliação de uma AT, você pode consultar o Guia para implementar avaliações nos serviços de hematologia e hemoterapia na perspectiva do Programa Nacional de Qualificação da Hemorrede

Tópicos Módulo 7

Referências

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Serviços de Hemoterapia cadastrados no Sistema Nacional de Cadastro de Serviço de Hemoterapia, HEMOCAD. Brasília, DF, 2000. Disponível em: <http://www1.anvisa.gov.br/anvisa/hemocad/RelatoriosHemocad.jsp>. Acesso em: 13 maio 2016.

AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Diretoria Colegiada. Resolução RDC n. 34, de 11 de junho de 2014. Dispõe sobre as Boas Práticas no Ciclo do Sangue. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 jun. 2014.

BRASIL. Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispõe sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as Drogas, os Insumos Farmacêuticos e Correlatos, Cosméticos, Saneantes e Outros Produtos, e dá outras Providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 set. 1976.

BRASIL. Lei n. 6.437, de 20 de agosto de 1977. Configura infrações à legislação sanitária federal, estabelece as sanções respectivas, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 ago. 1977.

BRASIL. Lei n. 10.205, de 21 de março de 2001. Regulamenta o § 4o do art. 199 da Constituição Federal, relativo à coleta, processamento, estocagem, distribuição e aplicação do sangue, seus componentes e derivados, estabelece o ordenamento institucional indispensável à execução adequada dessas atividades, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 mar. 2001.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 158, de 4 de fevereiro de 2016. Redefine o regulamento técnico de procedimentos hemoterápicos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 fev. 2016a. Seção 1, p. 37. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=37&data=05/02/2016>. Acesso em: 5 mar. 2016.

 

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção a Saúde. Departamento de Atenção Especializada e Temática. Guia para implementar avaliações nos serviços de hematologia e hemoterapia na perspectiva do Programa Nacional de Qualificação da Hemorrede. Brasília, DF, 2016b. Disponível em:<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_implementar_avaliacoes_servicos_hematologia.pdf>. Acesso em: 13 maio 2016.

LANGLEY, G. J. et al. Modelo de melhoria: uma abordagem prática para melhorar o desempenho organizacional. Campinas: Mercado de Letras, 2011.

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