Unidade de Aprendizagem III

Gestão da atenção à saúde

Módulo 10 – Organização da atenção

Cena 10 – O caso de Carlos chega ao Conselho de Saúde

 

O presidente do Conselho Municipal do Idoso, Ivan, vizinho de Carlos e conselheiro municipal de saúde, toma conhecimento de seu caso. Indignado, resolve levar a discussão para a reunião do Conselho Municipal de Saúde.

 

Iniciada a reunião, Ivan solicita a inclusão do caso de seu Carlos como item da pauta.

 

“Prezados senhores e companheiros de Conselho, esta semana tomei conhecimento de um caso grave que denuncia a qualidade da atenção à saúde no nosso município. Trata-se de um senhor de 65 anos que teve um diagnóstico de câncer de intestino e ficou mais de um ano para iniciar de fato o seu tratamento. Iniciado o tratamento verificou-se a gravidade do caso, especialmente pela demora no combate à doença. E tudo isso ocorreu por quê? Porque em nosso município, em nossa região, não há equipamentos disponíveis ou médicos suficientes para atender à demanda. Ele pulou de assistência em assistência até conseguir atendimento em um município vizinho. E lá também encontrou muitas dificuldades. Hoje, esse homem está usando uma bolsa para recolhimento das fezes; se sente extremamente afetado emocionalmente; é uma outra pessoa, não se reconhece mais. É essa a assistência à saúde que desejamos para o nosso município? Penso que este caso pode servir para refletirmos sobre a saúde na nossa região.”

 

- Senhor Ivan, eu não entendi um aspecto da questão: esse senhor não conseguiu o atendimento no município que nos serve de referência? – questiona outro conselheiro.

 

- Não. Ele não conseguiu realizar colonoscopia nesse município, negaram porque ele só tinha o pedido do médico da Saúde da Família – responde Ivan.

 

- Mas todo mundo sabe que tem uma regra, que exame especializado é só com o pedido do especialista, não pode ser da Saúde da Família. Esse médico não sabia disso? – retruca outro conselheiro.

 

- Pois é, mas é que estava demorando para marcar a consulta com o especialista e o médico da Saúde da Família já estava preocupado, por isso solicitou a colonoscopia. E tem outra coisa, eu também acho que precisamos rever essas regras que adotamos. Essa, por exemplo, de que o médico da Saúde da Família não pode pedir alguns exames, parece não ser muito boa – responde Ivan.

 

- Ora, senhor Ivan, não podemos mudar uma regra só porque em um caso... – intervém outro conselheiro.

 

- Não se trata de um caso, precisamos pensar melhor essa regra.

 

- Ordem, ordem. Minha gente, vamos com calma, vamos ter tranquilidade para discutir esse caso – pede o secretário de saúde.

 

- Pois bem, senhor secretário, o senhor poderia nos informar como temos resolvido essa questão da referência para outros municípios? Qual tem sido a orientação da secretaria? – pergunta um conselheiro.

 

- Senhores, essa não é uma questão fácil. Nosso município localiza-se numa região distante e de difícil acesso. Tenho enorme dificuldade em manter os profissionais de saúde lotados nas unidades e também de estabelecer relações com os municípios vizinhos. Não temos recursos suficientes para garantir um leque mais abrangente de especialidades e, mesmo que quiséssemos, teríamos dificuldade em implementar. Tenho solicitado com frequência o apoio da Secretaria de Estado de Saúde, mas não tenho obtido sucesso. O caso desse senhor extrapola os limites do município. No momento, estou em negociação com outro município de pequeno porte da região para fazer um consórcio intermunicipal de saúde, na esperança de juntar recursos para resolver alguns desses problemas – resume o secretário.

 

- Mas há questões nesse caso que poderíamos discutir, senhor secretário. Essa regra da Saúde da Família, o papel da central de marcação e outras.

 

- Regras precisam existir. Não posso aceitar, e outros secretários também não aceitam, que qualquer médico peça exames especializados. Isso pode gerar problemas financeiros inadministráveis no futuro. A central de marcação é fundamental para a organização das consultas e exames de forma mais justa.– retruca o secretário. Além disso, essas são regras da organização do SUS, não temos ingerência sobre isso.

 

- Senhor secretário, eu ainda acho que não estamos sendo sensíveis aos problemas que a população enfrenta – retoma Ivan.

 

- Estou de acordo com o senhor Ivan – soma um conselheiro.

 

- Eu também. Proponho que façamos uma oficina de trabalho para analisar os principais problemas que temos no município para garantir a referência dos pacientes – propõe o conselheiro.

 

- E a contrarreferência também! – adiciona um conselheiro.

 

- Isso, a referência e a contrarreferência – conclui o conselheiro.

 

O tópico de discussão do caso de seu Carlos foi encerrado e a oficina proposta não foi marcada. Apesar da comoção gerada, o problema suscitado não foi discutido em reuniões subsequentes.