Unidade de Aprendizagem I
Fundamentos do Sistema Único de Saúde e suas inter-relações com o envelhecimento
Módulo 1 – Percepções sobre a velhice
Leia a Cena 2: O encontro
Celina marcou de ir para o almoço junto com as amigas Ana e Cíntia. Não queria chegar sozinha. Reencontrá-las já foi uma festa. Todas estavam nervosas e animadas, como adolescentes indo para a primeira festa sozinhas, e seguiram para o encontro trocando ideias e impressões sobre os colegas e como os encontrariam. Chegando ao restaurante, rapidamente avistaram um pequeno grupo conversando animadamente e arriscaram se aproximar. Estavam certas, era o grupo da escola. Três pessoas já haviam chegado e agora, com Celina, Ana e Cíntia, só faltavam quatro para completar o grupo de amigos, dez ao todo. Os rostos eram familiares, mas diferentes, estavam marcados pelos anos. Alguns engordaram, outros emagreceram. A vida tinha sido mais ou menos cruel com cada um. Só José parecia o mesmo.
Nem cabelos brancos o danado tem... Será que ele pinta? – Celina perguntou baixinho para Ana. As duas riram ...
Passaram-se mais alguns minutos e chegou outro colega, com notícias de mais dois que não viriam, Lúcia e Isabele. Lúcia estava com muita dificuldade de locomoção e Isabele encontrava-se fora do Brasil, numa viagem com a família. A conversa estava animada. Todos tentavam se atualizar em relação ao que haviam sido os 50 anos percorridos. Muitos tinham mantido contato. As histórias de vida começavam a se apresentar e eram de todo tipo.
José resolveu lembrar a vez em que acamparam juntos numa praia deserta no caminho de Porto Seguro. Foram 15 dias com muito sol e sem água doce. Ninguém mais sabia dizer como tinham conseguido sobreviver tanto tempo naquelas condições, mas todos concordaram que a aventura tinha sido a melhor da vida deles. Daí começaram as promessas de novos passeios.
- Precisamos nos divertir como fazíamos naquela época! – Propõe Carlos.
Ana completa:
- Não sei se conseguiremos acampar, mas pelo menos podemos fazer algumas excursões, ou quem sabe nos encontrar para dançar.
Todos adoraram a ideia de dançar. Carlos fala do baile que frequenta às sextas-feiras:
- Eu frequento toda sexta o baile das 16. É bem divertido e, se quiserem ir, levo vocês!
Os amigos se animaram e por algum tempo voltaram a pensar e agir como se não tivessem amarras ou compromissos com nada ou ninguém. Mas não tardou alguém voltar à realidade:
- Pessoal, não sei quanto a vocês, mas tenho que cuidar de dois netinhos, dar uma mãozinha para minha filha – ressalta Cíntia.
Maria e Celina concordam, elas também tinham algumas dificuldades para sair. No caso de Maria as dificuldades financeiras eram as que mais pesavam, sua aposentadoria servia integralmente para pagar os remédios que consumia e qualquer outro gasto significava pedir ainda mais ajuda aos seus filhos.
Maria também sabia que a situação da amiga Lúcia não possibilitaria sua participação. Lúcia estava com dificuldade de locomoção e com isso fez um quadro de depressão, não havia quem a tirasse de casa...
Já Celina, preocupava-se nos últimos tempos em como dar suporte para uma tia próxima que sofria de mal de Parkinson e que a cada dia apresentava mais necessidades, além de muitas dificuldades para conseguir assistência adequada.
Os amigos começam a perceber que as histórias de doença e de cuidado invadiam sorrateiramente a conversa. As dificuldades financeiras, a necessidade de trabalho extra para custear as despesas, o tempo corrido e escasso para a família e amigos... Cada um tinha uma história, alguns encontravam mais apoio da família, outros serviam de apoio.
A história mais triste foi trazida por Carlos, com notícias de Antônio, um dos ausentes. Carlos não queria estragar o encontro, mas teve que dizer aos amigos que Antônio estava muito mal, num estado avançado de demência. A família tinha muita dificuldade para cuidar dele, por falta de recursos e também porque as relações entre eles nunca haviam sido muito boas.
De fato, a vida não parecia fácil para ninguém. As situações de doença e o sentimento de desproteção surgiam como uma constante nas falas. Os amigos se solidarizavam e várias ideias e soluções eram apresentadas para os casos mais críticos.
Apesar das histórias tristes, o encontro encerra-se com a sensação de querer mais. Naquele dia, todos pareciam ter voltado no tempo e se desligado de seus problemas cotidianos ou pelo menos os viram de outra forma, e assim puderam partilhar suas angústias e pensar soluções diversas.
O convite para o baile estava de pé e um próximo encontro já estava marcado. Em uma semana alguns deles voltariam a se encontrar!